Algumas razões do atraso gaúcho – por David Coimbra

As coisas que não vou escrever sobre o RS

Estava decidido a escrever que os gaúchos acreditam em bandidos e mocinhos. Que, para os gaúchos, a vida é um Gre-Nal. As coisas são boas ou más, certas ou erradas. É uma existência sem matizes, sem gradação. Tudo é branco ou preto. Donde, o entredevoramento histórico dos rio-grandenses. O governador do PT faz algo, o sucessor anti-PT vai lá e desfaz. E vice-versa. O gaúcho acredita MESMO que alguém se alça ao poder só para praticar o Mal. Obviamente, o alguém que é do outro partido. Então, esse alguém não é digno de nenhuma colaboração, para ele só se reserva a oposição explícita e a sabotagem implícita. Pobre Olívio, pobre Yeda, pobres todos os que tentam construir algo no Rio Grande. Eles nunca são julgados com condescendência, para eles não existe a compreensão racional, média e fria. Não. Para eles só há o amor do simpatizante e o ódio do inimigo, e nenhum deles vale muito, porque ambos são incondicionais.

Também estava decidido a escrever sobre o regionalismo obtuso do gaúcho. Em muitos outros lugares do Brasil, como na Bahia, o regionalismo serve para universalizar a cultura, para levar a Bahia ao mundo. Aqui, serve para isolar o Estado do mundo. Não é regionalismo, é provincianismo. Dia desses, um jogador do Botafogo reclamou de um juiz gaúcho, desabafando:

– Eles nem querem fazer parte do Brasil…

Foi criticado pelos gaúchos que não viram, naquela manifestação inocente, o que o resto do Brasil vê nos gaúchos.

Estava decidido também a escrever que essas são as causas do estrondoso atraso do Rio Grande do Sul. Quem quer que visite outros Estados da federação se espanta com isso. As coisas, no Brasil, estão acontecendo. Aqui não. Aqui as estradas estão congestionadas, a Educação regride, as ruas se tornam mais perigosas e os projetos, quaisquer projetos, dormem décadas nas gavetas dos gabinetes. O Rio Grande do Sul ideologizado, ranzinza, rançoso, antropofágico, anda para trás.

Pois bem, estava decidido a escrever isso tudo, mas afinal resolvi que não. Resolvi escrever sobre o Rio Grande do Sul que funciona. Encontrei um. Está lá no alto, na Serra: o complexo Gramado & Canela.

Você pode não gostar de ir a Gramado, mas terá de reconhecer, se lá for: lá existe um movimento orgânico pelo bem comum. A comunidade inteira se envolve no projeto da cidade. Ou da região. A forma como você é tratado nos hotéis e restaurantes, a forma como os motoristas se comportam no trânsito, tudo faz parte de uma consciência coletiva. As pessoas, em Gramado e Canela, trabalham unidas por Gramado e Canela, numa comunhão do poder público com a iniciativa privada que é ágil e funcional. Como eles conseguiram? Como criaram esse oásis de entendimento nesse deserto de eterna oposição? Temos de descobrir isso. Temos de estudar esse fenômeno. Então, talvez haja uma esperança de vida jovem para esse reumático Rio Grande do Sul.

Zero Hora



Categorias:Opinião

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42 respostas

  1. creio que o enfoque não era esse para o artigo…

  2. É… estamos tentando implantar um Projeto dos melhores do mundo há (pasmem) seis anos no RGS. E as coisas (burocracia estatal ” ? “) não deixam andar! Mas, por enquanto continuamos insistindo!

  3. Sem dúvida, a serra é que tem colaborado para desenvolver este estado e contribuído com a migração para desenvolver o resto BR. Já se disse que o que é bom já saiu do RS.

    Ficaram só os funcionários públicos (e os politicos). HEHEHEHEH

  4. Perfeito! Simplesmente perfeito!!!

  5. Não creio que a decadência do RS seja cultural. Pelo contrário. O problema é econômico-social. Industrias calçaditas se foram, as fumageiras estão migrando todas também, a industria metal-mecânica não vai bem por aqui….O Estado nao consegue competir na guerra fiscal, perde feio. Não tem recursos. O resultado é o que vemos. Junto com isso vem a pobreza e o aspecto feio das cidades, quesito no qual Porto Alegre é ícone. Porto Alegre é capital ícone de desleixo. Isso é mto triste!!!

  6. Não tenho dúvida nenhuma que a ida da Ford embora do RS foi birra, não política, mas ideológica (não vamos dar benefícios para uma multinacional) e, fora os petistas muito fanáticos, doentes mesmo, ninguém duvida que foi um erro enorme para o RS a perda dessa Cia, não só pelo que ela representaria economicamente, mas pelos investimentos paralelos e consequentes que viriam para o estado, porque 2 das maiores montadoras do mundo aqui se estabeleceriam.

  7. Essa questão de montadoras é muito mais complicada do que se supõe. Tem muito mais relação com logística do que qualquer outra coisa. O Paraná tem uma posição estratégica muito mais interessante do que a gaúcha. Por exemplo, da grande Curitiba para SP pela Regis Bittencourt são menos de 400 quilômetros. Em dois toques estão no maior pólo consumidor da América do Sul. E a um custo muito menor. Tem de ter muito incentivo pra atrair montadora para o RS. Foi justamente o que a Bahia fez: politicagem e incentivo (federal inclusive). É muita ingenuidade achar que o caso Ford foi apenas birra política provinciana. Aliás, já teve até decisão judicial favorável ao estado do RS sobre isso.

  8. A questão é que até uns 30 e poucos anos atrás o RS disputava com RJ e MG para ver qual estado era o segundo, atrás apenas de SP, em importância econômica para o Brasil. Hoje, não existe dúvida sobre isso, somos o 4° maior PIB do Brasil, bem atrás de RJ/MG, prestes a ser desalojado dessa posição exatamente pelo PR.

    Em importância política a coisa é pior ainda e acredito que isso não vá mudar, mesma a presidenta da República e presidente do Congresso sendo daqui, bem como o governador sendo do mesmo partido daqueles dois.

    Ainda temos um importância social/cultural relativamente maior, graças a colonização por gaúchos do oeste do Brasil e pela força do tradicionalismo, tão criticado pelo David. Aliás, esses dias apresentaram uma reportagem sobre a cultura gaúcha no programa Globo Rural. No final o apresentador disse que já foram catalogadas mais de 100 músicas tradicionais gaúchas e isso era mais do que na maioria dos países do mundo. Confesso, que fiquei com certo orgulho, mesmo não sendo um frequentador de CTG.

  9. Ricardo, só uma pergunta: quando a Renault e a Audi foram se instalar no Paraná, com muitos incentivos do governo do Estado provavelmente, houve uma discussão acirrado sobre se valia a pena investir nesse tipo de indústria?

    Ainda, houve algum caso de uma indústria desse tipo ter “desistido” de investir no PR, porque não era bem aceita por lá?

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