PoaTransporte: omissão, incompetência ou desleixo?

Desde sempre, os usuários de transporte coletivo de Porto Alegre sofreram com a falta de informações a respeito do serviço oferecido. Na contramão do exemplo de outras cidades desenvolvidas, os responsáveis pelo serviço, confortáveis na falta de concorrência e cobrança, sequer ofereciam mapas de bolso ou painéis informativos. Surgiu então a Internet, e mais uma vez o estabilishment optou por ignorar completamente as experiências bem sucedidas mundo afora em termos de sistema de informação ao passageiro. Enquanto serviços planejadores de viagem são o feijão-com-arroz por aí, Porto Alegre se limitava a uma mera lista de logradouros atingidos pelas linhas, categorizados por empresa, sem nenhuma indicação da localização dos pontos servidos.

Foi nesse cenário que surgiu a ferramenta PoaBus, fruto do esforço de um estudante de Computação de 5˚ semestre da UFRGS. Seu criador, Bruno Jurkowski, inspirado em iniciativas do gênero em outras cidades, pôs-se a desenvolver em seu tempo livre um sistema que pudesse auxiliar os passageiros a encontrarem as linhas que necessitam a partir de um ponto de origem e um de destino. No entanto, para colocar o serviço no ar, seria necessário ter os dados relevantes das linhas (trajeto, terminais, pontos, etc), o que fez o estudante procurar contato com a prefeitura em busca dos dados. Previsivelmente, encontrou apenas má-vontade e portas fechadas: o município, sentado em cima de um conjunto de informações ricas e úteis, negou acesso a um cidadão que queria fazer algo útil delas. No fim, Bruno apelou para ajuda das massas, permitindo que os internautas adicionassem as rotas que conheciam ao sistema colaborativamente. O resultado foi um estrondoso sucesso, espalhando-se rapidamente pelas mídias sociais e chegando à grande imprensa. Isso em Fevereiro de 2011.

Nada menos do que DEZ meses depois, a prefeitura, querendo mostrar serviço, lançou com cerimônia oficial sua versão oficial do serviço, com dados alimentados pelos bancos de dados da EPTC, e deu-lhe o nome de PoaTransporte (original, não?). No entanto, a prefeitura demonstrou sua incapacidade de entender o problema que o sistema se propunha a atender: no sistema oficial, o usuário apenas pode descobrir, clicando nas paradas, quais ônibus a servem. Para qualquer pessoa com mais de três neurônios, essa abordagem é simplesmente inútil: uma pessoa pesquisando a linha que deve usar sabe apenas a origem e o destino de sua viagem; neste método, o usuário teria que fazer verdadeiros malabarismos para encontrar sua resposta, primeiramente localizando o a parada mais próxima a origem, depois na mais próxima ao destino, comparando a lista de linhas servidas em cada parada em busca de uma linha que lhe sirva. Obviamente, quando a viagem requer uma baldeação, o usuário está vai ter que testar todas as linhas em ambas paradas, buscando o ponto onde deverá fazer sua baldeação.

Questionada pela inadequação do serviço, a prefeitura retrucou afirmando que estava implementando uma parceria com o Google, visando a disponibilização das informações no já aclamado Google Maps, efetivamente ganhando algum crédito “por estar fazendo alguma coisa que é tecnicamente difícil”. Só que eu não me convenci. Duvidando que exista uma dificuldade técnica na implementação desta parceria, pesquisei a documentação técnica do serviço Google Transit, e concluí que, tendo em mãos a base de dados do serviço, é absolutamente simples fornecer os dados no formato esperado pelo Google: tão simples que um estagiário conseguiria fazer em uma tarde de trabalho e umas duas latas de Coca-Cola.

Todo este texto acima não deveria surpreender ninguém, pois conhecemos o ritmo de tartaruga da administração pública desta cidade. O motivo deste post, na verdade, é denunciar a incompetência da prefeitura na gestão do serviço de transporte público, ao permitir que existam informações grosseiramente erradas em sua base de dados, como mostrarei. Quando a informação tinha apenas uso interno, os erros talvez não causassem problemas; agora, com um sistema público baseado nestas informações, essa incompetência acarretará grandes inconveniências ao cada vez mais sofrido usuário.

Tudo começou hoje à tarde, quando um colega de trabalho, necessitando ir à Rodoviária após o expediente, começou a buscar por linhas no PoaTransporte. Procurou então no mapa a parada localizada em frente à Rodoviária, onde uma miríade de linhas lhe foi oferecida, reproduzida parcialmente abaixo. Logo identificou as linhas da Sertório na lista e, sabendo que estas servem as imediações da origem de sua viagem, iria tomar estas linhas. Por cacoete, ele perguntou-me se aquela linha servia, ao qual lhe adverti que era basicamente o pior erro que ele poderia cometer, uma vez que as linhas advindas da Farrapos não atendem a parada da Rodoviária, e que ele acabaria parando no Mercado Público.

informações grosseiramente errôneas no poatransporte

informações grosseiramente errôneas no poatransporte

Agora, imaginem uma situação como a acima, mas onde o usuário não tem a quem perguntar ou confirmar a rota. Ou mesmo um usuário que seja de fora da cidade e conheça pouco o sistema viário. Ele iria acabar longe de seu destino, correndo risco de perder o horário de partida de sua viagem ou compromisso importante. É completamente inadmissível que um sistema oficial contenha erros desse porte. Não se trata de uma falha isolada; diversas outras paradas da admitidamente confusa região da rodoviária contém listas errôneas, sugerindo por exemplo que os ônibus rumo ao túnel param na Rua da Conceição (quando param somente na Júlio de Castilhos), ou que todos os ônibus da Farrapos param naquelas últimas paradas fora de corredor (somente os que vêm da Cristóvão param).

Onde mais existem esses erros? Como eles afetam o usuário? Como confiar em um sistema nessas condições?



Categorias:Descaso, EPTC, Infraestrutura, Mobiliário Urbano, Opinião, Rodoviária de Porto Alegre

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19 respostas

  1. É meio óbvio, para mim, o porquê de ainda não termos um banco de buscas bom e eficiente, seja pelo Google Maps ou não: HORÁRIOS!
    A EPTC não fiscaliza nunca os horários dos ônibus. É uma vergonha tu olhar no site e ver que tal linha passaria de 10 em 10 minutos, no máximo em 20 minutos em horários menos procurados, e tu fica, em horário de pico, 30 minutos esperando o mesmo.
    Não adianta reclamar para as empresas, não adianta reclamar com a EPTC. Faz o que então? Corre pra parada e fica lá, com cara de bunda, atrasado.
    Porto Alegre é uma vergonha em vários assuntos, mas o trânsito e transporte tá demais!!!

    • O Google não requer os horários em seu sistema. Apenas paradas, linhas e frequência na semana (i.e. se a linha vem todos os dias, etc).

  2. O poatransporte, usa api sem uma chave, ou seja está burlando a regra de uso dela.

  3. E quero saber também o que devemos fazer com um sistema de ônibus que atende mal e porcamente seus usuários. Nos horários de pico, os ônibus (principalmente os da Carris) vão em comboios de dois ou três, o que vai provocar inevitavelmente uma espera ainda maior para quem perdeu o “comboio”. E o que motiva esses acúmulos? Não só a quantidade de veículos nas ruas, mas principalmente a mudança da porta de entrada, que era a de trás, para a da frente – mudança essa enfiada goela abaixo da população sem a mínima consideração pelo porto-alegrense, já que foi tomada pensando unicamente nas empresas. O que acontece? O diminuto espaço entre a porta de entrada e a roleta impede que o usuário entre rapidamente no ônibus, formando invariavelmente, do lado de fora, uma fila para entrar no ônibus (mesmo que ele esteja vazio no fundo). Resultado: os ônibus ficam parados desnecessariamente segundos preciosos apenas esperando que os usuários entrem – e provocando atrasos que vão aumentando a cada parada. Resultado: os ônibus de trás pegam paradas mais vazias e acabam se aproximando dos da frente. Por que a Prefeitura continua fazendo de conta que não vê isso e não corrige esse problema colocando o cobrador mais para trás do ônibus ou simplesmente revertendo a porta de entrada?

    • Grande comentário! Sou totalmente a favor de colocar o cobrador no meio do ônibus, como era ha um certo tempo. Ainda mais com esse controle de entrada com um sistema lento pra caramba. São minutos e minutos perdidos na entrada, podendo o ônibus estar em movimento já.

    • Já eu acho que não deveria ter roleta nem cobrador. É assim que funciona em quase todo o resto do mundo. Por que quando bolaram o Tri não incluiram a retirada das roletas?

  4. O Site http://www.trafeguebem.com.br tem como ideal ajudar os usuários de transporte publico a encontrarem informações necessárias para seu deslocamento. E visa abranger todo o estado do Rio Grande do Sul. Atualmente já está mapeada toda a cidade de Porto Alegre, com todas as linhas de ônibus, lotação, paradas, pontos de taxi e horários.
    Ele ainda conterá informações como tempo médio e preço na medida em que forem sendo adquiridas essas informações.

    OBS: Desenvolvido por Ederson Brilhante – @ederbrilhante

  5. Ao passo que é interessante a EPTC estar acatando a sugestão da população (poabus, adesivo nas paradas), é também intrigante que todas as inovações recentes tenham sido propostas pela população – e são um tanto quanto óbvias para qualquer profissional da área. Para que servem os atuais chefes e diretores da EPTC se estes não fazem o seu serviço? Creio que os servidores já estão há tanto tempo engessados sem conseguir desenvolver nada que já perderam as esperanças…
    Acatar soluções da população por outro lado, dá votos, sob o pretexto de “ouvimos os anseios da população”.

  6. Sou mestre em computação e confirmo que toda a base de pesquisa de onibus do Google pode ser usada, bastando a prefeitura importar os dados que já possuem para dentro do sistema.

    Estou por dentro do assunto porque estou orientando 2 alunos de graduação precisamente neste tópico.

    A única tabela que falta com relação ao que já tem no PoaTransporte para que o Google consiga calcular o trajeto para o usuário, e seus horários, é a dos tempos de chegada dos onibus em cada parada.

    Nada que não dê para fazer em (estrapolando) uma semana.

    Mas fiquem tranquilos que se a prefeitura não fizer nada… em 6 meses teremos o trabalho de conclusão dos meus alunos prontos com tudo isto implementado.
    Por outro lado, o lado bom do PoaTransportes é que eles disponibilizaram toda a base de dados da prefeitura para que outros a utilizem.

  7. Enfim o cidadão na dúvida buscou junto ao site da Pref. Mun. POA/EPTC o melhor percurso para a Rodoviária visto que o mesmo estava na dúvida, para seu espanto a dúvida virou uma angústia, tão o descaso e despreparo com o atendimento no serviço de transporte público de Porto Alegre.

    O que teria levado a EPTC em demonstrar este tipo de serviço de péssima qualidade, aliás, a quem interessa tudo isso.

    É incrível que ainda estejamos tão longe do ideal, isto que hoje possuímos tecnologia de ponta para a prestação deste tipo de serviço, o que teria impedido o acesso de parte da EPTC a fornecer informações vitais para a implantação de um programa disponível a todos os cidadãos de maneira clara e objetiva.

    Depois vêm as críticas e os Agentes Públicos ficam irados com as postagens de vários cidadãos em blogs que poderiam via de regra prestar informações essenciais.

    E ainda verifica-se algo muito grave de parte de uns Vereadores da Câmara Municipal de Porto Alegre com a negativa de se realizar a Licitação Pública de Concessão das Linhas em Porto Alegre, seria a pressão dos empresários, seriam as doações de campanha para muitos Vereadores, que via de regra parecem defender os empresários com unhas e dentes.

    Esperamos que o Min.Público Estadual cobre de imediato de parte da EPTC o devido processo de Licitação, concessões essas existentes até hoje sem a devida Licitação Pública.

    Vamos ficar no aguardo de manifestação do Min. Público Estadual contra esse descaso por parte do erário público municipal de Porto Alegre.

  8. É triste isso. Em 2010 fui para São Paulo e circulei por três dias pela cidade somente de ônibus e metrô, graças à integração com o Google Maps.

    Em 2011 fui para o Rio de Janeiro onde tive mais uma prova da eficiência do Google Maps e ineficiência da gestão pública, estava com um folheto da prefeitura na mão em forma de matriz com as linhas de ônibus que serviam diferenes regiões da cidade, por exemplo, Copacabana p/ Barra, Lapa p/ Leblon, etc…

    Pois bem, precisava me deslocar da Lapa até o Cristo, no folder da prefeitura tinha só um – indicando que não havia uma linha capaz de realizar este deslocamento, mas como eu tinha feito uma estensa pesquisa não me abati, me dirigi à Rua Riachuelo, aguardei 10 minutos e peguei o 497 Penha x Cosme Velho, #win.

  9. é importante aproveitar o momento de atenção que a internet está recebendo pela mídia para colocar o dedo na ferida da ineficiência da prefeitura para essas questões de transporte.

  10. Nãp precisa buscar exemplos mundo afora. O Rio de Janeiro tem um sistema de informação exclente, e tem paradas de ônibus que são um show, e com informações completíssimas, muito completas mesmo, e tudo de forma bonita, agradável e conservadíssimo por todos, as paradas são um exemplo de limpeza.

  11. Acho que todas as pessoas que se sentirem lesadas deveriam processar a prefeitura, pois só assim é que se impõe respeito!

  12. ontem mesmo estava pensando nisso
    o poa bus da de 10 a 0

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