O fim do congestionamento: utopia ou possibilidade?

O grande desafio no Brasil é implantar redes de transporte coletivo abrangentes e de alta qualidade nas cidades de grande porte

Cidade com grande índice de congestionamento créditos: Buzrael

Por Luis Antonio Lindau, PhD, diretor-presidente da EMBARQ Brasil*

Nas últimas décadas entregamos o espaço viário ao automóvel. Hoje, buscamos soluções para um dos piores impactos desta decisão equivocada: o congestionamento. Muitos acreditam que só o metrô resgatará a mobilidade das cidades, pois mostrou-se eficaz em metrópoles que implantaram redes com várias linhas.

Londres e Nova Iorque têm redes superiores a 350 km, consolidadas há mais de meio século. Pequim e Xangai estão chegando lá: nos últimos 12 anos, saltaram de parcos 50 para mais de 350 km, a partir de enormes investimentos estatais. No Brasil, apesar dos 30 anos de investimentos em metrô, Rio e São Paulo carecem de uma rede abrangente e sequer ultrapassaram os 50 e 100 km, respectivamente.

Metrôs têm alto custo e longo período de implantação. Não são trechos ou linhas isoladas que salvarão as várias grandes cidades brasileiras. Se acharmos que a solução para o congestionamento passa por um sistema que aqui cresce 3 km por ano, estaremos fadados a um futuro ainda mais caótico.

No cenário mundial atual, ditado por parcerias público-privadas, é difícil imaginar a construção de grandes redes de metrô em qualquer cidade. A iniciativa privada precisa de investimentos com garantia de retorno financeiro e isso limita sua participação a trechos de linhas de metrô com alto potencial de passageiros.

Sabemos que investir só em transporte coletivo não resolve o congestionamento. Mas para desestimular o uso do carro, precisamos contar com uma rede de transporte coletivo de alta qualidade e penetração. É por isso que mais de cem cidades do planeta reordenam o uso de suas superfícies, dedicando faixas com 3,5m de largura ao transporte coletivo, que carrega até dez vezes mais pessoas que automóveis. Somaram a isso alguns dos atributos mais almejados pela população: conectividade, rapidez e confiabilidade.

Para atender bem, uma rede de transporte coletivo precisa conectar múltiplos pontos durante grande parte do dia. Seus veículos precisam circular livres do congestionamento, com curtos intervalos e garantia de chegada no horário previsto. Ao “metronizar” o ônibus (definição do urbanista Jaime Lerner) e combinar linhas paradoras com aceleradas e expressas, o BRT proporciona o mais eficiente uso da superfície viária.

O Rio consolida sua rede integrada de transporte coletivo com corredores BRT que devem ultrapassar 150 km até 2016. O trecho inicial do Transoeste recebeu 90% de aprovação. A boa avaliação segue a tendência de outros BRTs, como o da Cidade do México. Na pesquisa do periódico Reforma (2011), o BRT inclusive supera o metrô como o melhor sistema: 7,8 a 6,9 na avaliação dos usuários.

O ataque ao congestionamento começa pela implantação de uma rede de transporte coletivo de alta qualidade que atraia a todos. Essa é a premissa para conter o uso irrestrito do automóvel. Mas quando chegaremos lá? Para termos redes de transporte coletivo de alta qualidade, compatíveis com nossa realidade financeira, basta tirar o foco da estéril discussão metrô versus BRT e agir.

*Artigo “A saída é a rede BRT” originalmente publicado no jornal O Globo, em 07/09/2012.

mobilize.org.br



Categorias:Meios de Transporte / Trânsito

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25 respostas

  1. Eu só sei que, depois de mais um feriadão onde ficamos horas e horas em congestionamentos em praticamente todas as estradas e centenas de brasileiros perderam a vida nas estradas país a fora, é perceptível a falta de infraestrutura e de investimentos para qualificar os sistema de transporte brasileiro.

    Precisamos urgentemente de trens e metrôs. E essa revolução tem de começar agora, porque só assim conseguiremos aproveitar essas facilidades um dia.

    • Este é o ponto. Se faz um cálculo frio de custos e simplesmente se ignora o massacre que é o trânsito no Brasil. Se tivéssemos trens de passageiros quantas vidas iríamos poupar por ano. Qual o valor dessas vidas?

      Posso dar um exemplo que para mim é doloroso. Perdi os meus dois melhores amigos em acidentes de automóvel. Um terminava a residência em neurocirurgia após estudar primeiro e segundo grau, faculdade de medicina, residência em neurologia e residência em neurocirurgia. Abstraindo a parte emocional, este profissional trabalharia mais trinta anos na sua vida rendendo quanto para a Nação Brasileira?

      O segundo era engenheiro e tinha terminado a pouco o mestrado em solos, iria trabalhar os mesmos 30 anos, rendendo frutos para todos. Quanto vale estes 30 anos?

      Estou falando friamente, pois tanto um como o outro deixaram filhos e esposa (e um amigo que não conseguiu até hoje encontrar duas pessoas do mesmo calibre do que estes). Eu pagaria do meu bolso um bom dinheiro para manter estes dois vivos, pois a perda que temos é algo que realmente não tem preço.

      Poderia colocar o nome dos dois aqui no blog, mas em respeito aos seus descendentes não o faço.

      Quando vejo por exemplo aquele candidato que quer afrouxar as punições aos infratores me dá uma raiva que não sei se um dia ao vê-lo ao vivo e a cores não lhe enfio a mão na cara.

      O trânsito é algo que devemos pensar bem, pois vidas estão em jogo, e vidas de pessoas que nos estão próximas e que só vamos sentir a sua falta quando as perdermos.

  2. Sei lá, para mim o grande problema do metrô é o valor do investimento mesmo. Nossos governos historicamente tem taxa de investimento baixíssima, e uma única linha em POA vai custar 2,5 bilhões… imagina quanto tempo vai levar para fazerem outra (sem intervenção federal, como foi o caso).

    Mas realmente, não tem por que não botar VLT e aeromóvel na discussão.

    • Felipe, o dinheiro está disponível e vamos gastá-lo todo, sem economizar um centavo! mas o ponto é como distribuir esses 2,5 bi de forma mais eficaz e duradoura. Não acho metrô caro, metrô dura centena de anos. Lá no passado pessoas ficaram pensando que metrô é caro e hoje continuamos com corredor de ônibus sendo reconstruído a cada 5 ou 6 anos e trocando de ônibus a cada 4.

      Veja o Trensurb, que foi comprado usado do Japão e até hoje está em melhores condições que muitos ônibus de PoA.

      • Bem, vamos lá, quanto a prefeitura gasta em transporte público por ano? Quantos anos de orçamento dão 2,5 bi? Tendo este tipo de número podemos conversar melhor.

        • Mas não é 2,5 bi por ano, em cem anos dá 25 milhões por ano. Uns 30 CCs já paga isso.

        • Na verdade, 2,5 bilhões não dá mais do que meio ano do orçamento de Porto Alegre e se contarmos só os investimentos deve dar mais que uns 3 ou 4 anos. Entretanto, o certo é que enquanto, a questão do sistema federativo brasileiro não for equalizada, os Estados e principalmente a União Federal devem assumir esse papel de financiar a construção de redes de metrôs nas grandes cidades brasileiras, pelos motivos que todo mundo sabe – ficam a maior parte dos nossos impostos.

        • A estimativa para a prefeitura é 5,1 bi para 2013 (para um ano só). E isso é só da prefeitura, fora o estado que é diretamente beneficiado e o governo federal que tem forte participação financeira.

        • Peraí, para usar todo orçamento da prefeitura vcs teriam que cotar todo orçamento de saúde, segurança, educação, etc. Pior do que tá não tem como, né? Tem que pegar o orçamento de investimento em transporte público. Eu sei que em 100 anos a coisa se paga, mas para construir precisa ter antes, nem que seja via empréstimo, mas tem que ser pago igual.

          Concordo que o pacto federativo é um lixo, mas é o que temos hoje.

          • Pergunta: quanto é o orçamento para infraestrutura de transporte de Porto Alegre? Como ele é gasto? Quantos quilômetros de VLT ou Aeromóvel poderiam ser pagos com este orçamento?

        • Exatamente, por isso exceto São Paulo (o município, e mesmo assim ajudado pelo governo estadual paulista), não tem nenhum grande brasileira que conseguirá fazer essa revolução sozinha.

        • A EPTC arrecada 30 milhões por ano em multas! Se todas as multas de trânsito fossem revertidas em transporte público teríamos 200m de metrô por ano! Só em multas, limpo, sem considerar o retorno de investimento.

      • Honestamente não acho o trensurb um bom benchmark. Da última vez que olhei nem bancos para sentar tinha mais, pois faltava espaço para a demanda. E metrô de superfície é bem mais barato de construir.

  3. Gilberto, Pablo, André, Julião…….e outros.

    Já notaram o seguinte, brigamos até por tipo de árvore e cor de parede, agora em trânsito está se chegando a um consenso. Temos que achar uma maneira de ampliar este círculo e levar este consenso a população.

  4. Sim, ele fala que BRT é a solução esquecendo que praticamente TODOS os ônibus dependem de combustíveis fósseis.

    E quando esse combustível ficar cada vez mais caro? vai me dizer que BioDiesel vai atender?

    • O Biodiesel por sua característica de depender de insumos de petróleo, subirá seu preço na mesma velocidade do que o petróleo.
      Daria como sugestão a chefia que colocasse no Blog um link que existe sem cobrar nada e sem propaganda que indica o preço do petróleo nos últimos dias e em séries de 1 até 5 anos, o link se encontra em:
      http://oil-price.net/index.php?lang=pt
      É interessante pois mostra que mesmo com a crise internacional, olhando nos últimos cinco anos a subida é lenta, porém constante, e como muito bem diz o Alex tanto os ônibus convencionais como os BRTs estão atrelados ao combustível fóssil.
      Temos no Rio Grande do Sul, biomassa convencional (palha de arroz, galhos de reflorestamento, um monte de vacas, porcos e galinhas – com seus excrementos, etc.) o único local no Brasil onde a geração eólica é econômica, muitos aproveitamentos hidrelétricos a serem aproveitados (grandes, médios e pequenos), tudo isto para gerar energia elétrica nas próximas décadas com custos constantes, e pensamos em modais que consomem diesel?

      • É isso aí, converter fontes químicas, cinéticas e potenciais para um denominador comum – elétrica, afinal é o que melhor conhecemos até o momento.

  5. Blá, blá, blá, blá, blá, blá… BRT.

  6. A EMBARQ Brasil é uma entidade destinada a promover o BRT como panaceia universal para solução de problemas de transporte nos países latino americanos.
    A EMBARQ Brasil é uma espécie de ATP internacionalizada, e como tal ela se dedica a formar looby em favor do BRT.

    O maior problema dos BRTs é a concorrência com outros modais que não o ônibus. A visão da EMBARQ Brasil é simplesmente impedir o acesso dos automóveis ao centro da cidade dando como única opção ônibus ou BRT.

    Metrô, VLT, bondes e aeromóveis são os inimigos a ser abatidos no transporte das grandes cidades, apoiam as ciclovias porque sabem que em determinadas cidades e determinados trajetos a bicicleta não é uma solução para o transporte de massa, esquecem que as linhas de metrô começaram pequenas e com o tempo eliminam praticamente outros modais.

    No próprio texto do Eng° Lindau ele cai em contradição quando fala que Pequim e Xangai em menos de 12 anos estão aumentaram as redes de transporte em 300km, também esquece que hoje em dia em São Paulo o transporte seria inviável sem a presença do metro não haveria BRTs para transportar 4 milhões de passageiros por dia como transporta o Metrô paulista, também esquece que mais uns dez anos este número de passageiros pode até dobrar a medida que várias linhas estão sendo ampliadas, outra linha está em fim de construção e mai outras em um ou dois anos começarão a ser implantadas.

    Nenhum metrô nasce pronto, a observação de que um metrô composto de uma só linha não resolve o problema de uma cidade é de uma obviedade cavalar, mas esquece o caro colega que mesmo os metrôs de Londres, Paris, NY e outros começaram por uma linha numa época em que as máquinas de escavação eram a vapor e a maior parte do trabalho era feito através de emprego intensivo de mão de obra.

    O que a EMBARQ Brasil quer é dar uma sobrevida maior aos ônibus até que as cidades se tornem inviáveis e o custo do combustível totalmente proibitivo. Se tivéssemos há dez ou quinze anos já começado alguma linha de metrô, talvez neste momento estivéssemos construindo a segunda e planejando a terceira.

  7. Lindau constrói um falso dilema : metrô X BRT . É lobista do BRT. No seu universo mental não existe VLT.
    O resto é conto de ninar ..

  8. É um pensamento muito imediatista achar que o metrô é caro… quando dizem que metrô demora 20 ou 30 anos para se pagar, eu penso que uma linha de metrô dura mais de cem anos com manutenção mínima, e isso significa 70 ou 80 anos de lucro limpo.

    Se lá na década de 70, quando iniciou-se os corredores de ônibus, não houvesse esse pensamento imediatista que temos até hoje, teríamos o metrô funcionando, pago e dando lucro limpo.

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