O lastimável estado dos monumentos de Porto Alegre

Vocês já repararam no estado dos monumentos de Porto Alegre? Quem chega à cidade e passeia pelas suas ruas, tentando apreciar as obras de arte públicas, deve ter pesadelos à noite. A situação da maioria dos nossos monumentos é simplesmente lamentável! Estão todos pichados, quebrados, muitas vezes com partes em falta.

Conforme o doutor em História da Arte e professor de Escultura do Atelier Livre, José Francisco Alves, o vandalismo nos monumentos se acelerou a partir do final da década de 1990 do século passado, há cerca de 15 anos, se intensificando a partir de 2004.

Monumento a Julio de Castilhos, um dos mais castigados pelo vandalismo. Foto: Gilberto Simon - Porto Imagem

Monumento a Julio de Castilhos, um dos mais castigados pelo vandalismo. Foto: Gilberto Simon – Porto Imagem

Um dos monumentos mais atingidos e, por sua expressividade plástica, mais danificado é o Monumento a Júlio de Castilhos. Inaugurado em janeiro de 1913, portanto com 101 anos, a obra de arte de Décio Villares agoniza na Praça da Matriz, um dos mais importantes pontos de atração da cidade.

Outros monumentos, como o Túnel do Túnel, da artista plástica Tina Felice, continua pichado numa das áreas mais visíveis da capital, a entrada do túnel da Conceição.

Outros exemplos do gritante descaso para com os monumentos de Porto Alegre, são as obras de arte de Xico Stockinger, na Praça Dom Sebastião e as 4 estátuas dos rios formadores do Guaíba, na mesma praça.

Ferrugem e pichações tomam conta da obra de Francisco Stockinger na Praça Dom Sebastião. Foto: Gilberto Simon - Porto Imagem

Ferrugem e pichações tomam conta da obra de Francisco Stockinger na Praça Dom Sebastião. Foto: Gilberto Simon – Porto Imagem

Mas quem são os responsáveis pela manutenção destas obras e por que não o fazem ? Boa pergunta. Atualmente a responsabilidade pela manutenção dessas peças está em fase de transição da Secretaria Municipal do Meio Ambiente para a Secretaria Municipal da Cultura. Mas nem todas elas possuem interesse cultural. Um inventário é necessário ser feito. Enquanto isso, as obras ficam entregues totalmente ao vandalismo e às intempéries sem qualquer trabalho de conservação.

Aqui, o Vinícius Vieira, que é presidente da Associação dos Escultores do RS (AEERGS), além de membro titular das Artes Visuais do Fumproarte e vice-presidente do IAB-RS nos esclarece alguns pontos sobre a situação dos monumentos em Porto Alegre.

Para a Associação dos Escultores do RS, qual a importância das obras de arte públicas?

Vinícius Vieira: A Associação dos Escultores do Estado do Rio Grande do Sul – AEERGS, fundada em 2 de abril de 1982, é uma entidade sem fins lucrativos, que entre outras ações, atua de forma permanente em defesa da valorização das obras de arte de visualização pública, acreditando na importância das diferentes manifestações de artes visuais como instrumento de fortalecimento do protagonismo desse segmento na construção coletiva da sociedade no contexto histórico. A constante atuação da AEERGS nessa construção é motivada pelo fato de que as obras de arte públicas, quando valorizadas, se tornam bens de natureza material, portadores de referência de identidade e de memória das coletividades, constituindo-se como patrimônio cultural de nossa sociedade, marcando a paisagem urbana mediante diferentes manifestações culturais que retratam cada período da evolução urbana das cidades.

Como Porto Alegre vem tratando essas obras?

Vinícius: Assim como em outras capitais brasileiras ou em diversos municípios do interior do Rio Grande do Sul, Porto Alegre possui um volumoso acúmulo dos fatos que vêm marcando de maneira significativa sua evolução, demonstrado principalmente pela manifestação da arte pública edificada em diferentes contextos na história, que constituem um patrimônio singular, formado por obras espalhadas por toda a cidade. São com elas, por exemplo, que os turistas fazem seus registros fotográficos na busca de elementos que sintetizem o pensamento de uma época. São elas que tem o papel de registrar os acontecimentos históricos, “guardando” a memória da cidade.

Infelizmente, nos últimos anos, Porto Alegre vem passando por uma série de depredações das obras de arte presentes no espaço público da cidade. Tal fenômeno vem ocorrendo basicamente por dois motivos. Um deles é um problema crônico que permeia todas as áreas no Brasil, a educação. Outro, mais palpável, é o recente descaso do poder público municipal na manutenção de suas praças, parques e logradouros, que fez com que as comunidades de bairro não se sentissem mais pertencentes àqueles lugares, vindo a abandonar tais espaços de uso coletivo, abrindo caminho para a depredação paulatina.

São centenas de bustos, placas e outros objetos que estão desaparecendo do espaço público, sem falar nas pichações que assolam praticamente todas as esculturas de Porto Alegre. O caso mais emblemático é o Monumento a Júlio de Castilhos, a principal obra da cidade, localizada na Praça da Matriz, sob “os olhos” do Palácio Piratini, da Catedral Metropolitana, da Assembleia Legislativa, do Palácio da Justiça e do prédio em que reside o atual prefeito de Porto Alegre.

De que maneira a AEERGS pode contribuir para evitar que esse patrimônio continue sendo depredado?

Vinícius: Em caráter de urgência deveria ser consolidada, mediante ações efetivas, a Comissão Técnica Permanente de Gerenciamento e Avaliação das Obras de Arte, Monumentos e Marcos Comemorativos, criada pelo DECRETO Nº 17.838, DE 25 DE JUNHO DE 2012. Além de representantes da SMC e da SMAM, também deveriam integrar a Comissão representantes do IAB RS, da AEERGS, da Chico Lisboa, do Instituto de Artes-UFRGS e de outras entidades com reconhecida atuação na área. Dessa forma, se daria as condições de acesso a informação e de fiscalização, cabendo à referida comissão assessorar a Administração Municipal em todos os assuntos relacionados com a preservação dos monumentos e valorização dos espaços públicos do entorno deles, bem como a apreciação de novos projetos para a instalação de obras de arte.

Recentemente a responsabilidade sobre as obras de arte públicas de Porto Alegre migrou da SMAM para a SMC, e a referida Comissão ainda encontra-se em fase embrionária de implementação. Uma lástima, pois já não se tem tempo hábil para recuperar as obras de arte da capital nas vésperas da Copa do Mundo no Brasil. A partir da consolidação de um espaço aberto de debate, as entidades da sociedade civil organizada poderão dialogar em condições de igualdade com o poder público, apresentando soluções para o caso.

Uma das primeiras ações que a referida comissão poderia sugerir seria a imediata criação de um departamento específico para cuidar do tema, pois já se sabe que a falta de manutenção permanente acaba gerando um efeito dominó, pois se verifica que as depredações não são abruptas. Elas acontecem paulatinamente em cada lugar, ou seja, vão acontecendo dia-a-dia e, por falta de manutenção, anima os que depredam, estimulando assim que novos “ataques” tenham sucesso. Um exemplo positivo desse modelo já existe na cidade do Rio de Janeiro, que mantém um departamento permanente, atuando diariamente na limpeza e no restauro das obras, desestimulando assim àqueles que tenham a idéia de realizar danos ao patrimônio público daquela cidade.

Qual a expectativa com a participação das entidades nas decisões?

Vinícius: Com a participação da sociedade civil no debate mediante a referida Comissão, abrem-se novos caminhos para avanços, com o poder público municipal dividindo as decisões com as entidades e organizações que lutam pela defesa do patrimônio. As ações conjuntas podem contribuir para que seja reassegurado aos cidadãos a permanência de seus referenciais básicos, da continuidade de sua história, da constância de sua vida e de sua cultura. Dessa maneira, com a participação popular, poderá se despertar a atenção da sociedade porto-alegrense para a importância da preservação das obras de arte públicas, unindo esforços para que elas permaneçam em seus contextos originais, conservadas, mantendo seu significado histórico-cultural, pois ali está contida a memória informativa acumulada da própria existência da cidade e das diferentes relações que cada cidadão construiu com as obras ao longo de sua vida.

Veja uma galeria de alguns monumentos em estado deplorável:



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20 respostas

  1. Domingo passado resolvi dar um passeio, indo a pé da Redenção até o Gasometro. Que desgraceira. Onde não tinha lixo jogado, a calçada estava quebrada; Onde não tinha algum sem teto alojado, havia mato em profusão.

    E o pior de tudo é o fedor da cidade. Muito pior que banheiro de rodoviária. E olha que foi o caminho todo, pois saí da Redenção e peguei a República, depois a Lima e Silva (única rua mais limpa), indo pela perimetral até o Gasometro.

    Isso não é questão de qual a melhor etnia ou qual a pior, mas sim de gestores públicos com um mínimo de vergonha na cara e que priorizem o que deve ser priorizado. E ninguem pode negar que a limpeza pública é prioridade.

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  2. Não apenas os monumentos, mas as praças de Porto Alegre estão em estado de calamidade. O bairro Itu Sabará, tão arborizado e cheio de praças, o que significaria uma grande qualidade de vida para sua população. No entanto, tem praça cujo mato está em quase 1 metro de altura. Totalmente abandonadas. Veja bem, será que é tão difícil pra prefeitura montar uma equipe permanente de manutenção das praças e dos monumentos? Ah, mas dinheiro pra CC sempre tem né?!

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  3. Quem será que negativou o post??? Será que essa pessoa gosta de passar pelos monumentos e vê-los podres ????

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    • Gente da prefeitura que prefere o silêncio em relação as coisas que não estão bem, acreditando no “o que os olhos não veem o coração não sente”. Como se as pessoas só vissem o que há nos jornais, blogs, TV…

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  4. Poderámos colocar ao lado de cada obra, quando sendo restaurada, um painel com espaço para os pixadores. Ao mesmo tempo um texto sobre o respeito para com estas obras.
    A educação deveria ter sido dada a cada cidadão, mas nosso país está um caos!

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  5. O projeto de transformar Porto Alegre em Havana está se vento em popa.

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  6. Não acredito em argumentos étnicos ou raciais para justificar o abandono de PoA. Acho que é um simples caso de covardia na hora de votar. Não interessas é esquerda ou direita, se continuar com o clubinho vai continuar na mesma… Os últimos 5 prefeitos são ícones da covardia. Preferem alimentar os velhos parasitas a levantar e cortar de uma vez o que só atrasa o município. Estou falando da ATP, sindicatos, taxistas, cobradores, mafia do lixo, RBS, construtoras, Grêmio, Inter,…

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  7. Pega as ações que se faz pro turismo na metade norte e o que se faz na metade sul.

    Pega as praias do norte e e compara com toda a Costa Doce ou praias do sul.

    Pega uma cidadezinha da metade sul e compara com uma cidadezinha tipo Dois Irmãos. Olha a diferença com o capricho da cidade!!! Não, não me venham falar em riqueza da cidade. Porque tem muita cidade na metade norte que não é rica, tipo as dos Campos de Cima da Serra, mas se capricho nas ruas, se vê os canteiros cuidadinhos, se vê limpeza na cidade inteira.

    Sim, ter uma origem guasca e, sobretudo, lusitana é isso: falta de visão e, no sentido de cuidado com a cidade, mentalidade tosca, bagunçada.

    E ter influência dos imigrantes quase sempre resulta em cidades que dá gosto de ver.

    Pobre Porto Alegre. Poderíamos estar situados na serra. Ou então deveriam ter trazidos imigrantes EM MASSA pra cá, para termos um povo com virtudes como a que os alemães têm, esse povo que gosta de ter um caprichadinho canteiro de flores e que gosta de limpeza.

    Podem me chamar de preconceituoso. Mas comparem com a mentalidade e a aparência vigente nas cidades de São Leopoldo pra cima.

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  8. .
    Como eu disse, Porto Alegre é bagunçaa da, quebrada, medíocre e sem preucupação em ser bonita por causa da cultura geral da cidade.

    Então aqui vem a minha tese, que parece preconceituosa: Porto alegre é assim por causa da origem da cidade, portuguesa e bagunçada, e também gauchesca a amante de acampamentos no meio do barro. Mas, principalmente a origem portuguesa.
    Origem em comum com toda a parte pobre e tosca do Estado, a parte sul. Mesmo em suas cidades mais dinâmicas, as cidades da metade sul são todas bagunçadas e feínhas.
    Tá, mas Porto Alegre não é pobre como elas. Mas é portuguesa.

    E agora vejam como são as cidades ao norte: a súper vistosa Novo Hamburgo, ou Bento Gonçalves, Passo Fundo, e as super empreendedoras e e de primeiro-mundo Gramado, Nova Petrópolis… nem parecem que são cidades do mesmo Estado que tem esta capital que não está nem aí com nada !!!

    São cidades com cultura de empreender, crescer, evoluir.
    Desde a menor cidadezinha, são cidades que tem cultura de ter um espaço público cuidado e caprichado.

    Por isso, minha tese preconceituosa é a seguinte: o Rio Grande do Sul que transpira primeiro-mundismo é o Rio Grande do Sul que tem influência “européia”

    Repito: o Rio Grande do Sul que transpira primeiro-mundismo é o Rio Grande do Sul que tem influência européia !

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    • Florianópolis é muito mais portuguesa que Porto Alegre e é muito mais limpa e organizada. Sempre cortam grama dos canteiros, há poda das árvores, há prédios antigos bem conservados…

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    • Infelizmente eu tenho que concordar contigo, depois que vim morar em Rio Grande percebi isso.
      Andando pelo centro tenho a impressão de estar em Havana, com tanto prédio antigo e caindo aos pedaços, essa cidade deve ser a inspiração dos guascas.
      Quanto a colonização portuguesa, não acho que seja só isso. O que deu errado foi a mistura de português com índio… kkkk

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    • Portugal não é na europa?

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  9. Pior que existe mais de um lado nessa história toda, e é um círculo vicioso. Em uma ponta, na maioria das vezes um menor infrator, que, sem generalizar, muito provavelmente vem de uma classe social baixa ou sem acesso à recursos generosos de educação, convivência social, etc. onde percebe-se que o governo falha. Quando vai para as ruas, vê um monumento que, olha só, está tão abandonado pelo governo quanto ele e sua família. Não adianta limpar, tem que educar. E não é “educar” dando atraque e pintando eles na calada da noite. É educar na escola, com recursos. Vem do básico.

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  10. …ou até mesmo alí em Novo Hamburgo.

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  11. O jeito de ser de Porto Alegre – desleixado; sem preocupação em criar coisas bonitas na cidade; população porca e que não tá nem aí com coisas feias; tudo quebrado e horrível; falta de empreendorismo para criar atrações na cidade; construção de coisas horrorosas; cidade mal-cuidada, etc… tem a ver com com a cultura da da cidade. Com a mentalidade da população. Sim, os políticos são podres, mas todos eles são, então, e isso não é a toa, isso acontece porque as coisas acontecem em sinergia com os anseios e os valores da cultura da cidade. Todos os governos “jogam para a torcida”.
    Essa cidade e seus moradores não desejam ter uma cidade progressista e ousada, não desejam grandes mudanças, e querem a todo custo a tranquilidade de uma cidade do interior.
    E também amam Porto Alegre, acham a cidade superior ao resto do Brasil, e se acham superiores aos brasileiros.
    E tem a relação com o espaço público: aqui somos brasileiríssimos no pior sentido de todos: o espeço público não é nosso espaço. Ninguém encherga a para de ônibus vergonhosa, a praça ou a rua quebrada como seus: são de ninguém.
    E dá-lhe colar cartaz de cachorro perdido, de compro cabelo e etc nos postes e paradas de ônibus.
    Também ninguém cuida dos canteiros, ninguém planta flores…
    Ninguém valoriza que construa prédios belos, como se faz em outras capitais ou até mesmo

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  12. A SMAM está mais preocupada em ganhar motoserras como compensação ambiental né.

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  13. Com o teu Post representaste todos os portoalegrenses e o Trade turístico que não tem voz junto aos órgãos competentes. Temos pena de ver as obras de arte e os monumentos em péssimo estado de conservação. Como moradora, raiva do descaso com uma cidade que já foi considerada bonita e organizada, como profissional, vergonha de mostrar e contar a história desses locais. Pensei que com a Copa, fariam um revitalização, limpeza e infelizmente nada..Mas valeu, repassei….parabéns pelo teu trabalho de sair pela cidade e fazer o registro.

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  14. Veja que esse monumento da Praça Dom Sebastião mostra muito mais danos do abandono do que do vandalismo. Por essa e outras que me dá nojo essa postura da prefeitura de PoA de que “não adianta arrumar porque o povo estraga”!

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