Quanto valem os 20%?

O governo municipal vêm se desgastando e se debatendo há dois anos para tentar revogar os 20% das multas de trânsito que a lei do Plano Cicloviário obriga que sejam investidos em campanhas educativas e em construção de ciclovias. Primeiro tentaram eliminar completamente esta garantia de investimentos, agora apresentam uma emenda que mantém os 20%, mas deduz deles toda obra cicloviária que o governo é obrigado a executar ao duplicar avenidas. Por que essa insistência em remover recursos do Plano Cicloviário? Qual a importância do valor de 20% das multas para o governo e para o município?

20% das multas, levando em consideração os últimos quatro anos, dá uma média de cerca de R$6 milhões por ano. Para os defensores da bicicleta como meio de transporte, esta é uma soma importante, já que equivale a 15km de ciclovias por ano (se utilizarmos o valor de R$400 mil por km, estimado pela EPTC). Se esse dinheiro tivesse sido utilizado desde 2010, Porto Alegre já teria 60km de ciclovias, sem contar as obras de contrapartidas e em duplicações de avenidas – ou seja teríamos uma malha cicloviária muito mais ampla do que a que temos atualmente, que é de apenas 20,5 km.

Por outro lado, o orçamento municipal para 2014 ultrapassa os R$6 bilhões, o que quer dizer que os 20% das multas equivalem a apenas 0,1% da receita do município ─ mas vale lembrar que o dinheiro das multas nem é considerado parte do orçamento e não está nessa soma. A Prefeitura está construindo sete novos viadutos e trincheiras na capital e a soma total dessas obras ultrapassa os R$200 milhões, somam-se a isso outros R$182 milhões das duplicações das avenidas Voluntários da Pátria, Tronco e Edvaldo Pereira Paiva, fechando um total de R$382 milhões em obras que atendem prioritariamente os automóveis particulares. Comparado a isso, os R$6 milhões em ciclovias são pouco, 1,57%.

É uma quantia pequena proporcionalmente, mas traria benefícios enormes para a cidade em médio e longo prazo: praticamente dobraria a malha cicloviária em um ano, possibilitando que cada vez mais pessoas utilizem a bicicleta com segurança para seu transporte diário, isso traria ao município economia em saúde, redução dos congestionamentos, redução da poluição e por aí vai. Além de conquistar a simpatia da população, que quer usar a bicicleta, mas tem medo de compartilhar a rua com os automóveis.
Me pergunto, esse dinheiro, seis milhões de reais por ano, vale todo o desgaste que a Prefeitura e os vereadores da base aliada estão sofrendo? Vale o desentendimento com a população?

É possível que a questão seja apenas o dinheiro ou tem algo mais que nós não estamos sabendo?

Reblogado de Vá-de Bici

Publicado em 17 de abril de 2014 por Marcelo



Categorias:Bicicleta, ciclovias, Plano Diretor Cicloviário

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25 respostas

  1. Acho muito justo que separem este dinheiro para investir em ciclo-vias, mas fico chateado com quem fala mau das obras para o trânsito dos veículos particulares. As obras para os veículos particulares precisam existir, pois o transporte público é caro e ineficiente. Sem transporte público e sem obras de infra-estrutura para os veículos particulares a vida das pessoas é difícil. Eu moro em Gravataí e trabalho na PUC. Divido a gasolina com um colega de trabalho. O trajeto Gravataí – PUC de carro leva 50min e custa 10 reais o trecho. O ônibus, “direto”, leva 2h e custa 7 reais. Ou seja, duas pessoas pagam 14 reais e levam o dobro do tempo. Por isso eu fico muito feliz quando a prefeitura faz viadutos, trincheiras, duplica avenidas, pois pessoas como eu, que não querem ficar 4h por dia no ônibus possam se locomover. Agora, porque não trabalho em Gravataí: Porque pagam pouco. Porque não moro em Porto Alegre: Porque custa muito caro. É a vida. 🙂

    • Fábio,
      O transporte público não vai melhorar enquanto o governo continuar desperdiçando dinheiro e espaço físico em obras para o automóvel particular. Se o governo investisse todos esses milhões no transporte público, ele seria mais barato e eficiente.

  2. A EPTC, e todos os orgãos municipais do Brasil, “investem” muito pouco em educação (se for comparar com seu orçamentos de R$ 180 milhões por ano).

    Temos uma lei valendo desde 2009 que obriga o gestor público (Cappellari e Fortunati) a gastar 20% dos recursos das multas em Educação do Trânsito e ciclovias. Essa lei sempre valeu, nunca foi derrubada (nem com liminar), além disse já existe 2 decisões judiciais – a pedido do MP – que obriga a EPTC a gastarem os 20% ( a última dá ate prazo e multa diária). O próximo passo é o processo de improbidade adminstrativa do Cappellari (esse cidadão diz isso em qualquer reunião que participa – os vereadores do governo repetem).

    No Brasil quem não cumpre lei vai para cadeia, mas se for político (e tiver nas “mãos” metade + 1 dos vereadores) tenta mudar a lei (para ver se vai colar).

    Em POA mais ou menos isso que o executivo está tentando fazer desde agosto do ano passado.

    Obviamente é um assunto muito delicado para os vereadores do governo. Ninguem quer ficar com a sina e ter que explicar (nos próximos 3 anos) pq na prática retirou recursos que estavam reservados para educação.

    Para ter uma ideia, até o vereador Valter Nagelstein está votando a favor da sociedade. Alias, o melhor discurso sobre esse tema foi desse vereador, resumiu perfeitamente o que grande parte da população de POA acha sobre o tema.

    Por isso a importância de toda a população do bem, que ache que somente educação melhorará a vida dos porto alegrenses, esteja na Câmara de Vereadores na próxima quarta-feira (e muito possivelmentes nas sessões seguintes).

  3. O problema é simples, trata-se da incapacidade generalizada de planejamento urbano da cidade a médio e longo prazo. O planejamento sempre é feito para 4 anos, visando apenas criar fatos para uma possível releição.

    • Exatamente, ao contrário de São Paulo. http://www.saopaulo2022.org.br/

      É por isso que São Paulo faz campanhas educativas como essa.

      • Será que é mesmo educativa? Duvido que se possa fazer isso tranquilamente em São Paulo.
        Seria muito bom se pudéssemos andar de bicicleta assim na tranquilidade que mostra este vídeo, assim até eu andaria, só que eu não vou me arriscar.
        Eu vejo todos os dias ciclistas que não respeitam os pedestres, não respeitam sinais de trânsito e fazem o que bem entendem.
        Atualmente se acham os maiorais porque andam de bicicleta, grande coisa. Já me enchi desta gente cheia de razão. Minoria ruidosa, só vejo ciclovias vazias…

        • São ótimos argumentos para investir-se mais em educação e ciclovias. Enquanto a prefeitura de Porto Alegre continuar com essa estupidez, vão haver ciclistas mais radicais encarando isso como luta, ativismo, conflito…

        • As ciclovias não vão encher até que haja uma rede extensa e as pessoas que tem medo de pedalar junto com o carro possam pedalar quase todo o trajeto em ciclovias. E para isso é preciso investimento.

          Mas acho que não dá para dizer que as ciclovias estão vazias, vejo cada dia mais gente as usando.

  4. A proporção de trajetos feitos em carros, motocicletas e ônibus (beneficiados pelos viadutos) comparado com trajetos feitos com bicicleta não seria perto dos 2%? Isto é, para cada trajeto feito de bicicleta, 50 trajetos feitos em veículos automotores. Se é maior que 2%, não o é por muito.

    Logo, a destinação dos recursos está sendo feita razoavelmente (com proporcionalidade), como manda a constituição.

    Alguém apresente aí estatísticas do número médio de trajetos diários realizados por meio de locomoção que podemos discutir a questão. Senão, tenho que ficar com a minha impressão subjetiva.

    • Em São Paulo menos de 30% dos deslocamentos são realizados com o carro. Em Porto Alegre só o que temos é que dos deslocamentos em veículos automotores, 50% é carros e 50% é de ônibus. Se retirar desses índices os deslocamentos exclusivamente a pé esse índice é deve chegar bem próximo aos valores de São Paulo.

      Obras de duplicação são obras para os carros, o ônibus passa pelo mesmo trajeto, independente de ser duplicada ou não. Se ela não é duplicada os engarrafamentos causados pelos carros prejudicam mais o transporte coletivo do que em vias duplicadas. A única obra para ônibus são os corredores exclusivos. Os viadutos são obras feitas devido ao excesso de carros, não ao excesso de ônibus.

      • Alguma estatística para Porto Alegre ou continuamos no achômetro?

        Tu esqueceu de contar motos tambem.

        De qualquer forma, como querem conduzir e planejar o futuro da cidade se nem sabem o que ela é no presente? Se não fazem pesquisas, como saber como alocar os recursos? Ideologicamente? No achômetro? Comparando Porto Alegre com uma cidade 15x maior e que tem 4 linhas de metro?

    • Mas sim, concordo que 6 milhões anualmente é um valor pífio. Logo, tem algo mais nessa história, senão ela não valeria o desgaste político.

      Meu chute é que a lei como esta escrita tem constitucionalidade questionável mesmo e a prefeitura espera derrubá-lá logo.

      Segundo análises que ouvi, o legislativo não pode propor leis que regulem a execução do orçamento, que é atribuição do executivo, pois interfere na separação de poderes. Apesar da receita de multas não entrar pro orçamento do município pois é receita sobre penalidade imposta, tem jurisprudência a favor de considerá-lá uma “receita orçamentária” e logo a lei seria inconstitucional.

      Outro problema da lei é que ela é municipal mas nem toda a receita de multas vai para o caixa só município. Há multas que vão para o caixa do estado, como multa por não pagamento do IPVA. Logo, novamente a lei não pode ser validada pois lei municipal não pode regular receita estadual. Claro que neste caso seria só o caso de reescrever o parágrafo.

    • O que a proporcionalidade do uso de bicicleta em relação ao resto tem a ver com a história? Desculpa mas não entendi.

    • Tem a estatística do origem-destino [1], que indica que em porto alegre apenas 26% das viagens são feitas por veículos particulares. Os outros 74% são compostos por transporte público (44%) e não-motorizado, incluindo a pé, bicicleta e afins (com 30%).

      Tu vê que segundo o teu argumento, da “proporcionalidade prevista em constituição”, estamos ferrados aqui em porto alegre.

      Talvez seja uma má impressão causada pelo trânsito caótico da cidade que te dê essa ideia de que a maioria se transporta de carro. Na verdade, o carro apenas ocupa a maioria da via (calculado em em torno de 80%, em estatísticas diversas) para transportar a minoria das pessoas.

      Como alguns gostam de ironizar, é a “ditadura da minoria” nesse caso.

      [1] http://www.mobilize.org.br/estatisticas/37/divisao-de-modais-por-cidades-i.html

    • quer uma estatistica para manter tudo como se está? quando nao se é isso que se quer…

    • A questão relevante aqui não é quantas viagens de bicicleta ou de automóvel são feitas atualmente, e sim o número de viagens que pode ser suportado por real investido em cada modal.

  5. É que eles não pensavam em investimento, eles pensam em despesas. 6 milhões por ano daria para contratar 20 CCs, dar isso para ciclistas é muito.

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