A Rua Riachuelo, no Centro Histórico de Porto Alegre, é a minha rua. Quando aqui cheguei em 1972 fui morar na Pensão La Maravilha, bem na frente do Cultural Norte Americano.
Atualmente, moro um pouco mais adiante, atrás do Teatro São Pedro.
Minha rua já foi a Rua da Ponte, mas ela não existe mais, muito menos palmeiras imperiais como a da Azenha.
A rua onde moro é uma das mais antigas do centro de Porto Alegre. Ela foi traçada no primeiro Plano da Vila, elaborado pelo Capitão Alexandre Montanha, ainda no governo do Brigadeiro José Marcelino de Figueiredo, na segunda metade do século 18.
Também já se chamou Rua do Cotovelo. E tinha sentido, porque o cotovelo existe até hoje, ainda guarda a sinuosidade das ruelas da formação de nossa capital.
A Rua Riachuelo abrigou algumas residências nobres, entre elas a primeira casa de Porto Alegre a ter vidraças, motivo de grande inquietação da população, acostumada a resguardar o interior de suas casas.
Moro na rua cultural da cidade, onde temos a Biblioteca Pública do Estado, recém restaurada e devolvida à cidade, o maior número de livrarias – apesar de algumas perdas – o Arquivo Público do Rio Grande do Sul – imaginem os tesouros que existem ali.
O Cultural Norte Americano que foi o local em que mais se ensinou inglês da cidade está terceirizado; a Fadergs, a Faculdade do Desenvolvimento do RS, tem vários cursos ali e mantem o auditório que era do velho Cultural.
A minha pensão La Maravilha não existe mais, botaram abaixo, como fizeram com vários prédios antigos. Mas resistem alguns. A Confeitaria Rocco foi restaurada, mas a desgraça ainda se abate sobre ela, continua fechada. Um dos maiores absurdos não só da minha rua, mas de toda a nossa cidade.
É verdade que perdemos o Pelotense, a Churrasquita, o Devon, três paraísos da gastronomia da cidade. Mas temos a melhor casa de massas da capital, o Atelier das Massas, que nosso artista plástico Radaelli mantem como um primor. Como não poderia deixar de ser os tempos de comida japonesa nos deu o Kantô que não faz feio diante dos outros.
Além de ser a rua dos livros e da cultura, é também da rua da beleza, pois ostenta dezenas de lojas de embelezamento, cosmeteria e artigos para estéticas e salões de beleza.
Os fundos do Teatro São Pedro, sua garagem subterrânea, os fundos do Tribunal de Justiça também ficam na Riachuelo.
Temos vários restaurantes, pubs, botecos, pequenos armazéns, e a fruteira mais cara da cidade, mas que tem o que nenhuma outra tem. Tem a Confeitaria Paris, que teima em ficar ali (quase) sempre aberta. Além é claro de um Zaffari, na esquina com a Marechal.
Os inferninhos ficam na Marechal, mas o “espalha chumbo”, as facadas, os gritos, carros desabalados, até os mortos acabam ficando também na minha rua. Afinal, não há rua perfeita.
E uma das coisas que mais me dói é o fechamento da Casa do Estudante, CEUACA. Por sinal, o que está fazendo o poder público para responder ao descaso em que ela está e às demandas por moradia reivindicada pelos nossos estudantes?
Da janela do meu apartamento consigo ver as torres da Igreja das Dores que começa na Rua da Praia, mas termina na minha rua. Tem também o Colégio Lasalle-Dores. O Instituto dos Arquitetos – seccional do RS, está ali no velho casario ainda nem todo restaurado. Tem uma Delegacia de Polícia também.
E o que mais tem? Ah, a entrada dos fundos para o Rua da Praia Shopping. Tem edifícios com aquelas passagens abertas embaixo, chamadas de peristilo. Ainda não conseguiram fechar como aconteceu na vizinha Jerônimo Coelho.
Não sei se na minha rua moram pessoas famosas. Só sei que ali moram pessoas que ainda conversam entre si, param nas esquinas, se abrigam da chuva nos (poucos) peristilos.
Talvez a sua rua tenha muitos encantos, seria bom pensar neles, para poder curtir mais e mais suas potencialidades.
A minha eu curto, eu cuido, brigo por ela.
Só me chateia o lixo espalhado por ela, os contêineres fedorentos, as calçadas mal cuidadas.
Mas a gente vai batalhando para que ela mude para melhor.
Minha rua não tem palmeiras imperiais, mas os pássaros gorjeiam nas várias outras espécies que a gente teima em manter em pé.
ADELI SELL é escritor e consultor.
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