Prefeitura de Porto Alegre decide fechar permanentemente oito comportas (atualizado)

Estruturas serão substituídas por paredes de concreto; obras devem começar no segundo semestre deste ano

Os problemas de vedação das comportas estão no centro do debate sobre as causas da histórica enchente de maio. Foto: Luiza Castro/Sul21

Cerca de 50 anos depois de sua construção, o Sistema de Proteção Contra Cheias de Porto Alegre terá mudança significativa no aspecto visual e funcional. A Prefeitura de Porto Alegre anunciou, nesta quarta-feira (19), que o Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) trabalha no projeto do fechamento permanente de oito das 14 comportas que integram o sistema de defesa da Capital contra a elevação das águas do Guaíba.

Segundo o governo municipal, o projeto está previsto para ser concluído em 30 dias e após o prazo será contratada a execução da obra. O plano é fechar definitivamente, com um muro de concreto, as comportas 3, 5, 7, 8, 9, 10, 13 e 14. A comporta 11 será fechada parcialmente, mantendo um vão de 4 metros de largura para acesso de veículos e pedestres no porto. A estimativa é de que o fechamento definitivo se dê entre o segundo semestre de 2024 e o primeiro de 2025.

Diretor-geral do Dmae, Mauricio Loss explica que a decisão parte do entendimento de que essas comportas estão fechadas há muito tempo e já não servem mais ao propósito de quando foram construídas, em que havia maior movimento de navios e fluxo de trânsito nos armazéns do Cais da Capital.

“Tínhamos um fluxo de cargas que embarcavam e desembarcavam nos armazéns e isso está completamente desativado. Havia acesso inclusive pelos trilhos do trem para dentro do Cais e depois os trilhos foram cercados pelo gradil de concreto. Os portões perderam a finalidade de entra e sai”, explica. “Os portões que ainda servem pra mobilidade, que ainda há um fluxo, vamos manter abertos, mas esses que já estavam permanentemente fechados, justamente por não haver mais atividades no Cais, vamos fechar.”

Localização das 14 comportas localizadas ao longo do Muro da Mauá, em Porto Alegre. Ilustração: Divulgação/Prefeitura de Porto Alegre

Loss diz que, mesmo fechadas, as comportas requerem manutenção. A falta de cuidados específicos tem sido apontada como uma das causas da histórica enchente do mês de maio, pois a água ultrapassou mais de uma comporta e invadiu o centro da cidade. Agora, para facilitar o serviço de manutenção, a Prefeitura formou a opinião de que é preferível fechá-las com um novo muro que, por sua vez, exige cuidados mais simples de preservação.

“Achamos por bem retirar as comportas e fechar com parede extremamente reforçada, que aguente a força d’água, bem vedada e isolada para que não haja infiltração de água para dentro da cidade”, explica Loss, ressaltando que os engenheiros do Dmae já estão trabalhando no projeto, que não é simples devido à exigência de as paredes serem robustas.

O fechamento definitivo da comporta número 3, por exemplo, na Avenida Mauá esquina com a Rua Padre Tomé, recebeu aval da Portos RS, que entendeu não haver mais necessidade dela ser aberta. Outras comportas, salienta o diretor-geral do Dmae, nem costumam ser vistas pela população devido às suas localizações “mais escondidas”. O peso de cada comporta varia entre 5 e 10 toneladas. Loss pondera ser difícil manusear as comportas, além de não ser possível garantir 100% que elas não vazarão. A substituição por muros, nesse sentido, trará vantagens à proteção da cidade, diz ele. “Tiramos essa preocupação de saber se a água vai passar ou não e colocamos o muro, justamente para segurança dos porto-alegrenses, para que a gente não precise mais se preocupar com isso e tenha a segurança de que a água não vai entrar por ali.”

Com três metros abaixo do solo e outros três acima dele, o Muro da Mauá tem 2.647 metros de comprimento e é responsável por proteger parte da área central da Capital. Situado às margens do Guaíba, entre o Porto e a Av. Mauá, ele faz parte do Sistema de Proteção Contra Cheias, constituído pelo muro, 68 quilômetros de diques, 14 comportas e 19 casas de bombas. O sistema foi construído entre 1968 e 1974 para evitar uma enchente semelhantes a de 1941. Em 2024, porém, o sistema falhou – segundo especialistas, por falta de manutenção e reparos.

Futuro do Muro da Mauá

A decisão da Prefeitura de Porto Alegre de fechar definitivamente oito comportas que integram o Sistema de Proteção Contra Cheias da Capital, algumas delas situadas junto ao Muro da Mauá, traz à tona mais um capítulo no já antigo debate sobre a derrubada da estrutura.

O novo projeto do Cais Mauá proposto pelo governo estadual, cuja concessão foi vencida pelo Consórcio Pulsa RS, prevê a substituição do Muro da Mauá por outra estrutura de defesa construída na beira do Guaíba, formada por partes fixas e móveis.

Conforme Mauricio Loss, a decisão da Prefeitura em fechar definitivamente algumas comportas não deve ser entendida como o engavetamento do projeto de derrubar o Muro da Mauá e construir um novo sistema de defesa da Capital. Ele destaca que a troca de algumas comportas por paredes de concreto é uma medida no curto prazo sob responsabilidade do governo municipal e que, caso o projeto do novo Cais Mauá avance, será uma decisão do governo estadual.

“O sistema de proteção contra cheias é responsabilidade do município e, no caso, do Dmae. O muro e as comportas compete a gente e é uma decisão nossa de fechar. A questão da concessão dos armazéns do Cais e a proposta de substituição do muro, isso compete ao governo do estado. Se for o caso, retira-se o muro e se faz esse novo sistema de proteção. O que nós não podemos é ficar sem o sistema de proteção”,   explica o diretor-geral do Dmae.

Link: https://sul21.com.br/noticias/geral/2024/06/prefeitura-decide-fechar-definitivamente-oito-comportas-do-sistema-contra-enchentes-da-capital/

Texto atualizado em 21/06/2024 – 10:20



Categorias:Enchente, Muro da Mauá, Reconstrução do Rio Grande do Sul após enchentes

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26 respostas

  1. A discussão é sempre válida, mas desculpem o meu ceticismo. No fim acho que vão simplesmente vedar essas comportas, pintar uma linha no chão e colocar uma placa escrito “proibido o avanço da água” e era isso. Até que eu veja algo sendo realizado de fato não boto fé em nenhuma solução mais avançada. Existentem tantos problemas muito mais simplórios que precisam ser resolvidos, como a ciclovia da Ipiranga que daqui a pouco faz aniversário de desmoronamento e que até agora nada de concreto aconteceu, que eu realmente não vejo o poder público municipal agindo de forma contundente para tornar o sistema de enchentes mais robusto. Eu sei que minha opinião é chata, mas infelizmente está calcada na realidade. Abraços, paz.

  2. Largando aqui como Praga (Cidade do tamanho de POA) lida com esse problema, desde a enchente de 2002 que quase destruiu o centro historico.

    https://climate-adapt.eea.europa.eu/en/metadata/case-studies/realisation-of-flood-protection-measures-for-the-city-of-prague

    https://markbakerprague.com/twenty-years-since-the-prague-flood/

    Concordo com o problema da opiniao pública que o Gilberto falou, que agora joga contra reformas, mas em Praga, todo ano é escolhido um local do rio para ser testado a barreira móvel. Existe uma “cultura” em relação as enchentes que se criou desde 2002. As pessoas veem os testes e os políticos falam sobre isso, por examplo esse post de poucas semanas atras:

    Zdenek Hrib é ex prefeito de Praga e aqui ele ta testando como uma ponte vai ser levantada no caso de uma enchente e também os bombeiros testando a barreira móvel.

    https://www.instagram.com/p/C8JwlUssz26

  3. O cais vai ter que ser pensado como uma área alagável, incluindo os armazéns. Nesse sentido, a ideia mais prática parece ser a de fechar esse muro todo mesmo e garantir que a água não passe daquele ponto. Ainda assim, acredito que seja possível fazer algo interessante para lazer, só nada daquelas estruturas que se imaginava.

  4. O muro (dique) tem que estar depois dos armazéns. Entre o rio e cais (sem comportas). Na cidade de Khabarovski na Rússia é assim. Um delta quase idêntico ao Guaíba e a cidade posicionada exatamente aonde está Porto Alegre em relação ao Delta. O dique foi feito em dois níveis escalonados por um plano que serve de passeio de pedestres, bicicletas, etc. Escadarias e rampas de concreto integradas ao dique promovem o acesso das pessoas ao rio. Assim o dique protege o cais e a cidade sem necessidade de haver comportas, que são sempre os elos fracos da corrente. Como não há mais serviço de estiva na parte do Cais Mauá, separar o cais do rio é a solução lógica e ideal.

  5. Embora o tema aqui sejam as comportas, comentarei que muro não se discute a utilidade e eficiência, desde que as comportas vedem adequadamente. Todavia, para o projeto de revitalização do cais o muro não terá serventia. Vão ter que pensar num sistema robusto e infalível para proteger a cidade e os armazéns desde a borda do cais. Quem vai desenvolver projeto com os armazéns vulneráveis? Cabe salientar que a plataforma com degraus sugerida no render do projeto só protegeria o empreendimento até 1,2m.

    • Duas considerações:

      O plano (render) idealizado para conceder o cais previa 1,2m de um tipo de escadaria. Poderia se expandir de forma retrátil caso necessário. Ou seja, poderia chegar a 3m se assim entendessem por útil.

      Tenho minhas sérias dúvidas se algum dia vai ser revitalizado o nosso cais. Não sei qual seria o custo de um novo sistema de contenção.

    • A enchente sepultou de vez a reforma do cais, isso pra mim é certo. O investimento necessário para conter novas enchentes (com a retirada do muro) não vai ser assumido por ninguém que não seja o poder público.

      • Par quem for assumir o cais, independente de ser viável economicamente a construção de um sistema mais robusto, tenho certeza de que as empresas interessadas naquela área usarão deste discurso do Thiago

        • Thierry, não acho necessário um sistema “mais robusto”. Esse sistema atual funcionaria tranquilamente se tivesse tido manutenção. Veja bem o que aconteceu: as borrachas das comportas estavam ressecadas, não vedaram adequadamente. Além disso, não acharam diversas peças, incluindo parafusos que seriam necessários para fixar as vedações. As comportas estavam emperradas. As casas de bombas não funcionaram como deviam. Teriam que ter sistema de energia alternativo caso fosse necessário for falta de energia (normal faltar energia num caso de inundação). Além do mais, me parece que os diques na zona norte não foram suficientes. Teria que haver uma revisão e provável aumento em altura e melhor compactação dos diques feitos de terra e rochas. Foi uma sequencia de falhas, que poderiam ter sido evitadas. O prefeito ja falou que vai sair em torno de 500 milhões de reais para reformar tudo. Não acho muito, haja visto que num caso de nova enchente, se evitaria muito mais gastos da reconstrução. Ele falou que não vai ser em 1 mês, nem 2 meses e nem 1 ano o tempo necessárion pra arrumar tudo. E dependerá de recursos estaduais e federais. Então vamos continuar um bom número de meses, talvez 2 a 3 anos em conpasso de espera pra ver isso tudo arrumado e em condições de funcionar adequadamente.

          • Obrigado pelo discurso Gilberto, mas eu me referia a um sistema mais robusto do que a arquibancada de 1,2m do projeto inicial, não em relação ao atual.

            Sei muito bem de todas falhas e deficiências do sistema atual e de como ele foi bem planejado e como tudo na cidade mau cuidado e jogado ao acaso.

            há anos aqui no blog eu comento sobre ser uma “cultura” da administração de POA não cuidar de nada, deixar ruir e depois vir com um super projeto de revitalização. Não foi nada diferente disso o que ocorreu agora com as enchentes, a diferença é que como quase nunca se precisou destes sistemas contra inundação nunca se fazia manutanção.

            Poucos dias antes da agua extravasar para dentro deporto alegre eu comentei aqui no blog que o sistema de proteção estava negligenciado, que todos sabiamos os pontos que iriam alagar primeiro: os bueiros no quarto distrito e a av praia de belas com refluxo de agua e por falha de infraestrutura de bombas linha da trensurb e av a josé de alencar e que alagaria o hospital e por ai vai… Ainda comentei sobre o DRENAPOA, estudo e projetos feitos em 2015/2017 para melhorar e reformar o sistema de drenagem da cidade, este que tinha verba federal disponível más o ex prefeito Marchezan preferiu não usar e devolver.

            As casas de bombas se sabe que não tem geradores e inúmeras reportagens do tipo “por que quando chove porto alegre alaga” e outras corriam pelo correio do povo, zh e outras mídias denunciando a falta de manutenção e não existência de previsão de gerador.

            Tem outra… o hospital mão de deus fez projeto e queria pagar pela reforma da casa de bombas do parque marinha, por que para eles é mais barato pagar pra consertar a negligência da prefeitura do que ter todo ano o subsolo alagado. Só que a prefeitura NÃO FOI ADIANTE na aprovação da doação.

            Não se enganem, onde tiver ocorrido uma grande tragédia sempre haverá um histórico de avisos por parte dos técnicos servidores públicos e de negligência por parte dos governantes

      • Não sei Thiago, talvez tu tenhas razão. Mas vamos ver o que vai acontecer nos próximos meses. Não esqueçamos que ja existe um vencedor da licitação da revitalização. Mas duvido que vá vingar essa atual empresa/consórcio. Ao meu ver, vão ter que refazer todo o projeto de revitalização, até por que a população vai ficar em cima cobrando muito do governo (com razão). Se forem fazer um novo projeto para contenção das cheias, vai ter que ser muito eficaz e capaz de convencer a sociedade.

        • Acho que a retirada do muro é inviável, ninguém aceitará isso. A revitalização terá que se adaptar, talvez fazendo um piso elevado em parte da área interna dos armazéns, para que seja possível ao menos resguardar mobiliários e equipamentos dos espaços comerciais que ali estiverem.

  6. A solução é a revisão completa desse sistema, sua atualização tecnológica bem como a readequação da capacidade de suporte, não se podendo abrir mãos de certas mudanças radicais de concepção e de projeto. Queremos por exemplo realocação da barreira na área central para através de um sistema de contenção padrão cidades europeias haver proteçã englobando os armazéns, o cais embarcadero e claro a cidade, só que de verdade, né!? Não resta dúvida que o que existe hoje por um conjunto de razões simplesemtne não funcionae não entrega proteção para a city ok, tanto por limitações do projeto em si como pela podríssima manutenção (não) feita. Esperamos que as pessoas abram finalmente suas mentes, para a mudança, senão essa Porto Alegre dese jeitinho de sempre, esses improvisos, essas soluções de botequim, vai afundar de vez.

    • Concordo, mas vai ser algo dificílimo tirar o muro atual pra substituir por um novo sistema. Digo difícil em termos de opinião pública.

      • Infelizente, por décadas Porto Alegre deixou de pensar em novas soluções pois se apoiava nesse muro como uma bengala. As mesmas pessoas que dizem que o projeto do muro era “moderno” ou “duraria 100 anos” dizem que o sistema falhou por falta de atualização.

        Mantendo muro ou não, precisamos pensar em alternativas e inclusive em redundâncias para evitar que esses tipos de incidentes ocorram novamente.

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