ESPECIAL: Uma tarde falando sobre Porto Alegre

BLOG DO DAVID COIMBRA

Há alguns dias participei do Café ZH, no Theatro São Pedro. Minha tarefa, aliás agradável, foi conversar com três ex-prefeitos de Porto Alegre, João Dib, Guilherme Socias Villela e Olívio Dutra. Falamos sobre um assunto que muito me apraz e sobre o qual eles são especialistas: Porto Alegre. Não foi uma entrevista; foi uma conversa mesmo. Tento reproduzi-la abaixo quase que em estado bruto, com pouca edição, para o que, espero, seja deleite dos leitores:

Dib, Villela e Olívio durante Café ZH

David – Bom. Esse nosso encontro não é uma entrevista. É uma conversa. Sobre a minha cidade, Porto Alegre.

Villela – Tu és o único aqui que é de Porto Alegre.

David – É mesmo. Vocês são do Interior… Aliás, Porto Alegre recebia muita gente de outras cidades. Hoje, muita gente de Porto Alegre está retornando para o Interior.

Villela – O primeiro Congresso Municipal de capitais que houve, eu acho que foi em Brasília, havia,  isso faz 30 anos, havia uma certa disputa para saber qual era maior cidade em população. Porto Alegre era a quinta. Aí me perguntaram se eu estava satisfeito. Eu respondi que o ideal seria o décimo lugar.

David – Agora conseguiu…

Olívio – O bom é que Porto Alegre pudesse ser sempre uma cidade de porte médio, cosmopolita por conta do Porto, por ser a capital, estrategicamente aqui nessa região do Mercosul, mas também tem esse ar comunitário que aproxima as pessoas. O bom é a cidade não fosse maior do que já é.

David – O último censo mostrou que a população não cresceu.

Dib – Mas em compensação o número de automóveis cresceu enormemente e nós não temos plano de controle disso. Porto Alegre é uma das cidades que tem proporções maiores de veículos por habitantes.

David – E aí uma consideração: o que falta em Porto Alegre é projeto de cidade. Muitas vezes o prefeito fica só como um zelador e não se tem um pensamento sobre a cidade, o que se quer sobre a cidade…  O que é Porto Alegre? É uma capital de serviços? O que se quer para Porto Alegre?

Villela – Porto Alegre hoje tem uma vocação de uma cidade de serviços, porque as indústrias que existiam e que estavam especialmente na Zona Norte se mudaram  para outros municípios. Municípios geralmente da região metropolitana. Então Porto Alegre deixou de ter indústrias para se transformar em uma cidade de serviços, basicamente isso.

Olívio – Agora eu acho que, com o avanços, digamos, da moderna tecnologia de informação, da informática, computação, chamado de mecanização no meu tempo de militante sindical bancário, isso, digamos, criou para cidade, para Porto Alegre, enormes possibilidades, quer dizer, substituiu um tipo de indústria por outra, não é mais a indústria metal mecânica pesada. É aqui a cidade referência para um grande setor de serviços, área da comunicação, área da complementação, área de gerenciamento, área de planejamento de ações, das empresas locais, regionais e outras que aqui se instalam. Então Porto Alegre continua sendo uma cidade que é referência para investimentos improdutivos, investimentos especulativos. Eu acho que essa questão de pensar a cidade não é privilégio de nenhum de nós. Essa cidade foi pensada desde que foi transferida de Viamão para cá. É uma cidade, ela tem uma topografia especial, essa topografia foi sendo trabalhada na ideia de construir as relações da península com os bairros. Isso foi sempre pensado, as intervenções. As histórias de Porto Alegre a gente sempre viu, sentiu, percebe. Tinham a ideia de que Porto Alegre tem um espaço com fluência não só das águas do rio, como também o achego de pessoas, colônia alemã, depois a colônia italiana, os brasileiros mais para o lado de Santo Antônio, Gravataí, essas cidades. Porto Alegre sempre foi uma síntese de todas essas coisas, todas essas vertentes, então ela foi planejada para isso, para ser acolhedora.

Dib – Essa mistura de etnias aí não é problema. A cidade precisa de um plano diretor e Porto Alegre é a cidade brasileira que tem mais tempo de história de plano diretor e, infelizmente, nós não temos hoje um bom plano diretor. Em 1979 nós fizemos o melhor plano diretor da cidade. E agora?

Olívio – Veja Dib, eu tenho uma opinião diferente sobre o plano diretor, que não é uma peça meramente técnica ou exclusivamente técnica. Ela é essencialmente política. O plano diretor é uma busca de articular os interesses mais diversos que legitimamente atuam na cidade e trabalhar não só a questão do centro, a relação com os bairros, a relação com as vilas, mas a relação do espaço urbano com o espaço rural do município de Porto Alegre, que são mais de 15 mil hectares. A cidade é uma relação de várias partes com topografias inclusive diferentes e também com culturas diferentes. Porto Alegre é uma cidade que eu digo cosmopolita e ao mesmo tempo provinciana, e isso é bom. E tem essa questão de uma península, uma ponta que avança aqui pro rio e que pra se chegar aqui no centro tu vens por um caminho e pra sair quase que para os mesmos caminhos. Evidentemente um metrô hoje, aqui, custaria milhões de reais. Se pudesse ter sido feito lá atrás evidentemente que era bastante caminho andado. O Trensurb, ele tangencia a cidade, ele não atende uma parte principal da cidade que é esse miolo na direção aqui para o sul, para o leste, ficou no norte na relação com a região metropolitana. As linhas de ônibus até bem pouco não iam onde deveriam ir, não se relacionavam entre si, quer dizer, aos poucos esses enlaços vão se dando. Eu acho que tem grandes desafios sim em Porto Alegre para todos os que querem viver e temos o direito de aqui viver bem. Não é qualquer espaço, não é qualquer cidade no país e até no mundo que tem o privilégio que nós temos aqui de um enorme manancial de águas, de uma natureza também rica. As montanhas aqui de Porto Alegre, a sua área rural e o porto, que eu acho que é uma riqueza que deve ser revitalizada, mas ao mesmo tempo ser espaço de maior convívio social, cultural, econômico.

Dib – Aí é que eu queria voltar. Eu disse que o importante é o plano diretor. O Olívio falou duas vezes de área rural. Até 1979 tinha área rural em Porto Alegre. No plano diretor de 1999 terminaram com a área rural e agora não tem mais. É tudo área urbana. Então a Zona Sul, que era pra ser mantida como reserva ecológica, reserva ambiental, isso terminou. Então precisa um plano diretor, sim, pra dar ordem ao crescimento da cidade.

Olívio – O plano diretor tem que ser um pacto político da cidade. Os técnicos são indispensáveis e necessários, mas o plano diretor tem que passar por um processo de construção em que a cidadania seja ouvida, que partisse dessa construção, dessa pedra que não é pra funcionar pra um governo, pra um mandato, é pra prever a cidade que temos e também preparar a cidade que precisamos. Eu fui ministro das Cidades e nós pensamos isso lá para 5.560 municípios, pensamos em garantir que todos pudessem construir de forma participativa o seu plano diretor, inclusive com recursos do governo federal, mas com o objetivo de que o plano diretor expresse pluralidade e a diversidade de interesses e procure criar a base de convivência política democrática onde o interesse da especulação imobiliária, por exemplo, em muitos momentos, é legítimo e, em outros, ultrapassa o interesse público. O automóvel. Qual é o papel do automóvel? Você chega numa cidade e tem enormes prédios de estacionamento de automóvel e milhares de pessoas vivendo indignamente, e isso o plano diretor tem que prever. Isso não é uma coisa pra ser feita assim de afogadilho e segundo os interesses mais presentes ou mais vigorosos por grupos mais influentes, ele tem que ter um tempo de boa maturação. Eu acho que tá demorando demais, é evidente, mas há um processo, o ministério das cidades tem digamos recursos para estimular ou ajudar o processo de construção do plano diretor participativo. As regiões metropolitanas. Porto Alegre não está isolada delas. Porto Alegre faz parte de uma região,  ela não pode subordinar as outras cidades ao seu interesse. Ela também tem que dialogar com as cidades da região metropolitana, que são 25, então o plano diretor de hoje não é mais o plano diretor de um município se sobrepondo aos demais municípios, também há necessidade de realizar um diálogo na região metropolitana, planejar a região metropolitana.

Villela – Eu queria fazer uma abordagem um pouco diferente. Em parte concordo com o que foi dito aqui, o plano diretor é técnico, é político também, mas vamos imaginar a Santa Casa de Misericórdia. Ela tem dois séculos de existência. Quando ela foi construída foi feita fora da cidade pra evitar o contágio de moléstias, tanto que havia uma praça chamada Praça do Portão que era o único acesso à cidade. Porto Alegre, há um século e meio atrás, era habitada só no centro da cidade. Aí as pessoas passaram a morar na Independência e ali entra um fenômeno que é o seguinte: se dá uma espécie de crescimento que chamam nobre. Nobre no sentido de pagar mais imposto, pra ter mais poder político, pra poder pavimentar ruas, dar saneamento básico, etc. Então existe uma tendência de crescimento circular. A Independência foi crescendo e gerou o Moinhos de Vento, que gerou a Auxiliadora, que gerou Mont Serrat, que gerou a Bela Vista. Então são tendências históricas, e isso ocorreu em direção à Zona Norte. Em relação à Zona Sul houve também um crescimento espontâneo, mas poderia ter sido provocado pelo poder público. Vou dar um exemplo: a Érico Veríssimo, que foi construída na minha administração, é uma continuação da Aureliano de Figueiredo Pinto. Ela parou e nunca mais se fez nada em relação à Zona Sul, que está isolada porque só tem a Padre Cacique como acesso. Então digamos assim, nós imaginávamos ter, além da Érico Veríssimo, pelo menos uma bifurcação, uma em direção à Vila Assunção e outra Partenon, Glória, Teresópolis.

Olívio – A Restinga foi uma intervenção do poder público, que em determinado momento deslocou o excesso de população daqui e jogou para lá. Há mais de 100 mil pessoas morando lá, mas não se pensou como dar condições de transporte para aquela população, só mais tarde que isso foi feito.

David – Vocês têm falado num, digamos,  personagem das cidades do mundo: o automóvel. Como resolver o problema do automóvel, porque há em Porto Alegre mais de 600 mil automóveis para um milhão e trezentas mil pessoas.

 

Olívio – O prefeito de Londres tomou uma medida na City que foi retirar os automóveis particulares do centro. Ah, caiu o mundo sobre ele. Ele estabeleceu pedágios pra entrar lá. Então ele perdeu a eleição, mas o centro de Londres se humanizou.

David – Seria o caso de fazer isso aqui?

Olívio – É claro que Porto Alegre não pode ser vítima da lógica da indústria automobilística.

Dib – É por isso que vou voltar ao plano diretor. Um dia eu ganhei um livro e do livro do qual li uma frase só, fechei o livro e não sei nem onde está. A frase dizia que o político tem que ter sensibilidade e capacidade de resposta. Isso é muito importante. O político tem que enxergar o amanhã e não agora, o agora é fácil. Isso a população não tem como fazer.

Olívio – A cidade é viva e é vida, milhares de pessoas, convivência. A cidade não é só o negócio, a disputa, a competição. A cidade é um espaço que precisa ser mais humanizado, porque tem núcleos de organização, tem desigualdades enormes na cidade, na nossa como em diversas cidades do país. Hoje até nos mundos mais ricos se chega às cidades e já tem núcleo de pobreza, particularmente de imigrantes que vêm de outras regiões desses países que foram colonizadores. Então, precisamos pensar a cidade, como diria o Mário Quintana, olhar o mapa da cidade como se fosse o nosso próprio corpo.  Eu acho que as perimetrais são importantes, investimentos. Nós tivemos parte disso, em responsabilidades assumidas. Lembro que nós tivemos que enfrentar interesses pra não deixar nenhuma construção acontecer entre o rio e a Av. João Goulart, nem posto de gasolina, quanto mais prédios, e eu acho que foi importante isso, preservar aquele espaço para que a população pudesse estar mais perto do rio, já que o rio também tem um problema do muro e o muro não pode ser derrubado.

Villela – Eu fiz uma referência aqui sobre tendências que são espontâneas, eu citei a Independência, o Moinhos de Vento, etc, até a Bela Vista. Outra tendência que pode ser influída através do plano diretor e de vontade política, que foi interrompida, é a Érico Veríssimo. Esse exemplomostra como é importante o plano diretor, mas também é muito importante a decisão política de executá-lo. Outro exemplo: se não fosse a decisão que tive que tomar juntamente com o Dib e outros assessores de fazer o Parque Marinha do Brasil e o Parque Maurício Sirotsck, isso seria a nossa Rocinha hoje, um favelão. Já tinha 200 favelas lá, hoje.

Olívio – Quando cheguei à prefeitura tinha moradia irregular até de baixo do viaduto aqui na Salgado Filho, além de uma vila inteira debaixo do viaduto lá da ponte do rio Guaíba, na igrejinha ali na Festa dos Navegantes, além daquela enorme vila na Sertório, problemas seríssimos que não tinham sido resolvidos. Tinha a Vila Areia, a Vila Tripa. É claro que quem assume o poder público tem que assumir responsabilidades, intervir, mas ele não pode fazer intervenções simplesmente pela visão técnica, burocrática ou por uma visão do setor mais influente, então o plano diretor é uma construção coletiva em que técnica, sensibilidade política, cultura, comunidade têm que ser partes indispensáveis pra ele poder funcionar e a cidade poder ter intervenções mais articuladas da iniciativa privada, do poder público, a vida da própria comunidade. Nós temos, digamos, o Morro da Cruz: uma situação seríssima de exclusão social. Houve intervenções lá. Incluir aquela área foi muito importante. Mas quando você leva asfalto pra cima do morro, o asfalto não impermeabiliza? Impermeabiliza, a água cai e vem com toda força cá embaixo e cá embaixo você tem que ter uma estrutura de coleta das águas, tem que discutir isso, a comunidade tem de compreender que não é uma ação localizada que resolve o problema, compreender que tem ações interligadas que pra resolver um problema do bairro tu tens que agir do lado daquele outro problema.

Dib  – Eu acho que tem que planejar a cidade pra amanhã, por isso que eu gosto do prefeito Tompson Flores, do Villela e eu não deixo nunca de elogiar. Eu só vou dar um exemplo agora: o Pronto Socorro foi projetado em 1939 por alguém que era prefeito e que pensava nessa cidade pra amanhã. Então, foi projetado pra oito pavimentos, mas não tinha necessidade, então foram feitos três. Depois o Tompson Flores fez mais um pavimento e, agora, o que nós estamos discutindo? Ampliar o Pronto-Socorro. Quando o Tompson Flores fez o quarto pavimento, eu confesso que não sabia até pouco tempo que ele era pra oito pavimentos, mas ele fez, deve ter estudado as fundações, até.

 

David – Quando eu era pequeno, a minha mãe, que era professora primária, no dia em que ela recebia ela pegava eu e a minha irmã e descia a rua da Praia com a gente. “Vou comprar um brinquedo pra vocês”, ela dizia. A gente descia a Rua da Praia e aquilo era maravilhoso, era um programa, um passeio. A gente tomava lanche nas Lojas Americanas, comia sanduíche americano, para mim a Rua da Praia era o lugar onde as coisas aconteciam na cidade e era a principal rua do RS. Agora se perdeu esse interesse. A Rua da Praia morreu. Há como fazer com que ela voltasse a ser um espaço de convivência da cidade?

Olívio – Ela mudou devido à evolução do ponto de vista financeiro. As pessoas preferiram morar fora do centro, o centro passou a ser a localização de agentes financeiros, bancos e saiu o barzinho, saiu o local da convivência, saíram até as livrarias que tinham ali e saíram os paralelepípedos e veio um calçamento frio, tirou uma característica cultural ali. Depois buscou-se, nos nossos governos, desenvolver com a comunidade, particularmente com os artistas, uma retomada cultural do centro, para ter mais salas de exposições, para ter a Rua da Praia com mais exposição de arte, tipo o que tem lá na Redenção, mas de forma diferenciada, variada, e eu acho que isso ainda é um espaço a ser conquistado, humanizado, mas eu acho que o automóvel não pode ser a principal preocupação nossa no Centro, ele tem que ser tirado do Centro.

Villela – Um dos problemas do Centro que eliminamos foi com as linhas “Ts”. Naquela época, dois terços da população se deslocava até o Centro da sua residência ao trabalho para tomar outro ônibus. Com a invenção das linhas “Ts” foi possível tirar um pouco da população flutuante do centro para fazer com que a recuperação de prédios históricos, prédios do centro da cidade, venha a permitir que haja habitação naquela região. Aliás tem outro exemplo acontecendo no quarto distrito. Uma cidade foi projetada lá. Já estão começando, o projeto já está pronto, a licença está pronta.

Dib – Se houvesse continuidade administrativa nós teríamos resolvido o problema do transporte coletivo com muito mais facilidade. Na administração Villela foi iniciado
um projeto que se chamava Transcol. Mas de repente o projeto parou, já havia sido feito e não deu continuidade. Outra coisa que não tem nada que ver com trasnporte: onde é que foi feito o primeiro Natal Luz no RS? Em Porto Alegre. No ano seguinte não fizeram mais. O maestro Eliazar de Carvalho, o sonho dele durante 40 anos foi fazer o Natal Luz. Nós fizemos o Natal Luz em 85 e em 86 fizeram em Gramado. Por quê? Porto Alegre poderia fazer melhor ainda, mas, se foi ele quem fez eu não continuo, se fui eu quem fiz, ele não continua.

Olívio – A gente tem que aproveitar melhor os espaços e estimular a convivência, a fraternidade na cidade, isso é uma boa. O baile da cidade, no aniversário, a semana de Porto Alegre, segue uma série de atividades e de relações, mas que tem que ter um envolvimento não só da área central, de áreas diferentes da cidade. Eu acho que temos um potencial enorme de participação comunitária. Os movimentos de participação comunitária no país, desenvolvendo o meio ambiente, inclusive nasceram em Porto Alegre. Então tem uma riqueza que os governos têm que trabalhar. Eu penso que a solução dos problemas não vem de uma visão autoritária, de cima para baixo. A solução dos problemas de uma cidade como Porto Alegre é cada vez mais abrir espaços de participação popular comunitária. O orçamento participativo é um processo importantíssimo para ensejar esse envolvimento consciente, cidadão, no processo de construir a cidade, de viver a cidade e de controlar a ação do poder público, eu acho que a maior riqueza de Porto Alegre é exatamente a disposição do povo de Porto Alegre de participar, a pessoa estimular ainda mais, criar passos mais arejados, plurais. Eu acho que Porto Alegre não precisa de mega-projetos. Esses dias eu tava vendo Seul, a capital da Coreia do Sul. Lá eles construíram enormes elevadas para resolver problemas de trânsito. E em 10 anos tiveram que dinamitar tudo e encontraram outras soluções e aí estabeleceram uma regra lá que tem que tem que ter ônibus, pra cada 1.300 usuários . Então eu acho que tem que pensar de forma mais singela mas não menos radical, transformadora, como recuperar espaços urbanos. O centro de Porto Alegre tem que ser humanizado, tem prédios no centro de Porto Alegre que estão subutilizados, estão se deteriorando. Tem que haver uma forma de trazer o povo para morar no Centro, de criar condições adequadas de moradias nos prédios antigos ou recuperar as áreas degradadas por dentro e por fora. Nós podemos fazer isso em vários prédios aqui no centro de Porto Alegre, tanto aqui na Borges de Medeiros quanto ali na Farrapos, o antigo hotel Umbu, e tem mais áreas que podem e devem ser recuperados para moradia digna das pessoas.

David – Vou dar um exemplo. Talvez a melhor cidade do mundo, Paris. Ela foi planejada pelo Barão de Haussmann na época de Napoleão III. O que ele fez foi uma mudança autoritária. Depois, em 1902, 1903, tem o Pereira Passos que imita o Barão de Haussmann no RJ e faz uma reforma também autoritária. Mas essas mudanças foram fundamentais e talvez só tenham sido feitas porque houve o peso da autoridade.

 

Olívio – O futuro de Porto Alegre é não ter uma população maior do que um milhão e 500 mil, o futuro de Porto Alegre é não ter mais automóveis ocupando os espaços que já estão ocupados em demasia e apostar no transporte público de qualidade. Um serviço de qualidade que o Villela deixou, e foi bom, foram as lotações. Também é preciso estabelecer um diálogo entre o táxi e o ônibus, e nós podemos ter esse diálogo com o Trensurb e as ciclovias.

David – Não tem muita lomba em Porto Alegre para ter ciclovias?

Olívio – Tem, mais eu venho lá de casa na Assis Brasil e tem poucas lomba. Aos domingos quando eu estou em Porto Alegre, pego a bicicleta ali na Portugal e pego a Assis Brasil, Benjamin, Cairu, Voluntários da Pátria, Conceição, Mauá, Ponta do Gasômetro, passo depois na frente da escola técnica Parobé, entro nos Açorianos, vou no Parque Farroupilha, vou lá no fundo, volto pelo viaduto da Conceição e pego a Voluntários e é uma planície, as vezes eu vou pela Cristóvão Colombo aí eu tenho que pegar na contramão a Alberto Bins ali em cima até chegar lá.

Dib – Vão matar a gente aqui. Não existe educação. Quatrocentos e noventa e cinco quilômetros de ciclovias??? Avenida Independência toda a via é impossível.

Olívio – E nós aqui em Porto Alegre nós temos que dialogar com o Ministério das Três Armas, particularmente com o Exército, tem um espaço nobre da cidade, centro de Porto Alegre, que é do Exército. São as comunidades do Exército mantendo aqueles prédios como patrimônio histórico. Outra coisa é a antiga viação férrea, há espaços deteriorados, nobres na cidade, que estão sem a sua função social. O governo federal tem prédios que ele nem sabe onde é que estão e nem como estão sendo usados. Isso é patrimônio público.

David – Nesses prédios do exército, ali em frente existe o antigo Largo da Forca, na frente igreja das Dores, que eu acho que é a igreja mais bela do RS. Há toda aquela história ali, há os túneis do Palácio Piratini, a rua do Arvoredo, esses espaços históricos que são mal aproveitados. Não falta jogar luz sobre isso? Citando de novo Paris: lá eles aproveitam sua história, promovem sua história.

Olívio – Mas também tem a cultura, né? Paris é uma cidade que tem 2 mil e tantos anos, ela foi se transformando, nós não temos 300 anos. Mas é evidente que tem coisas importantes que têm que ser preservadas nessa história, nessa cultura. Nós temos que firmar a nossa identidade.

Villela – Vou citar um exemplo do que tu disseste. Eu morei alguns meses em Londres. Um dia perguntei para um londrino: “Essa ponte é antiga, né?” E ele: “Não. É nova, tem 300 anos”.

David – Agora nas eleições eu fui lá votar lá no IAPI. A minha mãe mora lá ainda. Era um domingo e eu estava com o meu filho, eu andava por lá e via o pessoal jogando bocha, umas três ou quatro pracinhas com as crianças brincando, os jovens jogando bola, o pessoal tocando samba no bar. Essa vida suburbana, rica…

Olívio – Tu sabes que foi o maior conjunto habitacional da América Latina. Era uma disputa entre Getúlio e Peron. Getúlio ganhou e foi quem construiu o maior conjunto habitacional popular da América Latina na época.

David – Os apartamentos são maravilhosos

Olívio – Bem-feitos, inclusive pensando na luz do sol, pensando no sol da manhã, no sol da tarde. Eu tenho parente que mora lá.

David – Um problema que houve no Centro de Porto Alegre é que havia uma rua que era um bulevar: era a Salgado Filho. Mas ela morreu por causa dos ônibus.

Dib – Em 7 de julho de 1977, às 8 horas da manhã, nós fechamos a Borges de Medeiros. Eu era secretário de Transportes e o Villela era prefeito. Não havia nenhum terminal de ônibus na Salgado Filho. Mas depois colocaram. Não era para colocar.

CONVERSA EXCLUSIVA ZERO HORA, TRANSCRITA INTEGRALMENTE PELO BLOG PORTOIMAGEM

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17 respostas

  1. O Villela tá a cara do vovozinho do filme Up!

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