Sobre o inventário dos imóveis do bairro Petrópolis. Caminho incorreto

Vista parcial do Bairro Petrópolis, a partir do 18º de um prédio. Foto: Gilberto Simon

Vista parcial do Bairro Petrópolis, a partir do 18º andar de um prédio. Foto: Gilberto Simon

Saiu no Diário Oficial de Porto Alegre no dia 22 de janeiro de 2014 a notificação da inclusão de aproximadamente 300 imóveis no bairro Petrópolis no Inventário do Patrimônio Cultural de Bens Imóveis de Estruturação, baseado na lei LC 601/2008. Os imóveis listados passam, então, a ser um patrimônio cultural e os proprietários tem 30 dias para recorrer.

A notícia do inventário pode ter vindo com muita alegria para muitos, mas acredito que poucos têm o exato conhecimento sobre o que isso significa e suas consequências. Antes de entrar nesta questão, é importante entendermos os tipos de imóveis com relação ao Patrimônio Cultural. Ele pode ser avaliado em três níveis dentro do patrimônio:

1) Bem tombado: classificação mais rigorosa, que impede tanto modificações externas quanto internas na edificação.

2) Inventário de estruturação (caso das casas notificadas): é aquela que por seus valores atribui identidade ao espaço, constituindo elemento significativo na estruturação da paisagem onde se localiza conforme art. 14 da L.C. 434/99 (PDDUA) modificada pela LC 646/10.

3) Inventário de compatibilização: é aquela que expressa relação significativa com a de Estruturação e seu entorno, cuja volumetria e outros elementos de composição requerem tratamento especial conforme art. 14 da L.C. 434/99 (PDDUA) modificada pela LC 646/10.

Os imóveis listados no Inventário de Estruturação não podem, portanto ser demolidos.

Qualquer intervenção neles deve ser submetida aos órgãos competentes para aprovação, no caso a EPHAC (Equipe do Patrimônio Histórico e Cultural). Na lei LC 601/2008, que é a base do inventário, e nos artigos citados na lei não fica claro quais mudanças são permitidas e quais proibidas. Mais do que a proibição da substituição de sua residência por um prédio de pequeno porte, por exemplo, isto significa que proprietários que queiram ampliar suas casas em qualquer quantidade de área, seja ela grande ou pequena, terá que submetê-la à análise da equipe do patrimônio e correrá o risco de ter seu pedido negado, já que as regras de reformas e ampliações não são totalmente claras. Além disso, toda comunicação visual nas fachadas de estabelecimentos comerciais também ficará a critério do órgão.

Nota-se, portanto, que os aproximadamente 300 imóveis listados ficarão praticamente estáticos em relação à sua forma básica (alturas por exemplo). Somam-se a esse número as casas do entorno, já que por estarem próximas às estruturadas, são classificadas como compatibilizadas e mesmo podendo ser demolidas terão que manter características dominantes semelhantes às anteriores. Muitas das casas listadas não têm nem mais suas características originais, ou não possuem valores arquitetônicos que justifiquem sua presença na lista deste inventário ou se encontram em um contexto urbano já descaracterizado.

Entendo que alguns imóveis possuam atributos a serem preservados pelo patrimônio e que o bairro Petrópolis tem uma ambiência agradável e que se deseja ser mantida, mas listar esta quantidade enorme de imóveis como estruturação significa congelar o crescimento de um bairro inteiro, que é papel do plano diretor da cidade, que permite o crescimento em densidade, área e altura. O caminho não está correto.

O bairro Petrópolis tem muitas características a serem preservados, muitos imóveis a serem mantidos, mas acredito que este inventário não é o caminho. A população deve se inteirar sobre o que está acontecendo e se manifestar a respeito. O futuro de um bairro não depende só de leis de órgãos municipais, mas de uma ação daqueles que diariamente fazem dele seu usufruto.

Em termos legais, lembro que os proprietários tem um prazo de 30 dias a partir da publicação no Diário Oficial de Porto Alegre para fazer sua impugnação no protocolo setorial da prefeitura. Esta impugnação não pode ter como base o estado de deterioração do imóvel, mas pode estar baseado em o imóvel estar situado em área com outros tipos de tipologias ao redor (edifícios, por exemplo) ou mesmo as características arquitetônicas não condizerem com o estilo de época a ser preservado com uma análise a respeito. O órgão responsável pelo patrimônio histórico da cidade é o EPHAC, onde podem ser retiradas dúvidas (telefone 3219-2385), localizado na Av. Bento Gonçalves 1129 conforme consta na notificação.

Texto: Arquiteta Angelica Diemer Crusius – CAU A73007-6

Fonte: Mais Petrópolis

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Obs.: o prazo para contestação foi prorrogado em 90 dias, a partir do dia 18/02/2014, quando foi publicada nova notificação no Diário Oficial de Porto Alegre, na página 16. Clique aqui para ler (pdf).



Categorias:Arquitetura | Urbanismo, Patrimônio Cultural, Patrimônio Histórico, Plano Diretor

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15 respostas

  1. O que adianta plano diretor se depois vem uma construtora e faz um prédio acima do limite e ainda fica contente em pagar a multa? Na minha rua, Maranguapé, há três prédios grandes, onde teoricamente o plano impediria. Na Guararapes há um de 22 andares.

  2. Os bairros Petrópolis e Jardim Botânico já estão saturados com tantos edifícios residenciais. As ruas já viraram estacionamentos…

  3. Incorreto é esse plano diretor fajuto, que ignora as necessidades da cidade e continua enchendo os bolsos dos mesmos há anos.

  4. Uma vez lendo plano diretor de Santa Maria, eu vi uma solução bacana, em uma região definida como “Zona de Interesse Cultural”, todos os imoveis tiveram seu potencial construtivo diminuído para 1, mas para venda de potencial construtivo o índice era 5.

    Dessa maneira a pessoa mantinha a propriedade e tinha como vender o equivalente a 5 propriedades iguais ao mercado como medida de compensação….Um baita negócio para o proprietário, queria eu ganhar de presente da prefeitura 5 casas iguais a minha para poder vender, e ainda manter a propriedade da original.

    Mas isso depende de leis municipais, cada município tem a autoridade de propor, o mais correto seria o Plano diretor de Porto Alegre proteger o Petrópolis e ser muito generoso nas compensações…mas aí está uma das raizes do problema.

    Como o presidente do IAB Holzmann bem definiu, quem projeta Porto Alegre?? O interesse do mercado imobiliário, não é comprar indice, mas se apropriar de áreas nobres da cidade. Não interessa para eles comprar indice construtivo e investir no Sarandi, eles querem construir no Petropolis, lançar o imóvel deles no bairro mais nobre.

    Como o mercado imobiliário é muito conservador, eles não se interessam por essa ferramenta, compra de índice, eles consideram isso coisas de comunista, de petista, e eles tem a seguinte mentalidade: “o dinheiro é meu, a propriedade é minha, eu faço o que eu quiser”.

    E mais o Plano diretor é uma iniciativa do executivo, que contrata tecnicos para elaborar, mas a palavra final é sempre dos vereadores…você imagina a atua câmara de vereadores de Porto Alegre alguem propor preservação histórica???

    No dia seguinte a Monica Leal aparece vestida de Miley Cyrus sentada numa wrecking ball…

  5. “Incorreto” (ruim) para os proprietários e Sinduscon, correto para a cidade. Petrópolis não pode crescer mais, já lotou, tá ficando impraticável. A cidade tem que crescer e se verticalizar em outros bairros. Minha humilde opinião, como ex-morador do bairro.

    • Se vcs pagarem o que falta do valor do imóvel, até concordo com vcs…

      • Incrível a falta de respeito de alguns aqui neste blog. A pessoa teve uma parte significativa do seu patrimônio subtraída arbitrariamente pelo poder público e não pode nem se queixar que já NEGATIVAM???

        Ta louco viu!!! Nestas horas eu penso se realmente quero continuar morando cercado de pessoas assim… afinal, nem apoio dos outros eu vou ter o dia que acontecer o mesmo comigo.

        #vergonhadeserbrasileiro

      • Essa visão de que as casas inventariadas se desvalorizaram ou desvalorizarão é imediatista e extremamente limitada, para se dizer o mínimo. No médio prazo uma vez sedimentada a questão do inventário, considerando-se a qualidade dos conjuntos preservados, haverá evidente valorização dos imóveis em questão e do entorno, inclusive dos edifícios de apartamentos que estão no bairro e contribuíram para a densificação e descaracterização da região. Falo como possuidor de dois imóveis (casas) no Petrópolis.

        Cabe salientar, também, que Petrópolis é dividido pelo Protásio Alves e a maioria dos imóveis inventariados encontram-se no eixo entre a Av. Ipiranga de modo que sequer se pode falar em estagnação do bairro no tocante a novos empreendimentos que permanecerão se evidenciando no Petrópolis.

        E, quem é proprietário de casa inventariada ou pretende investir reformando ou adquirindo uma para residência ou destinação comercial terá a tranquilidade de saber que o entorno está protegido da especulação imobiliária e da desvalorização decorrente da construção de um prédio de dez, doze andares lindeiro à residência unifamiliar. (esta sim uma desvalorização significativa) .

        Por fim, muitas pessoas deixam de investir para fins residenciais nos excelentes imóveis que ainda restam no Petrópolis por conta do risco em questão, e acabam optando pela aquisição de casa no bairro vizinho Três Figueiras.

  6. Querer tirar o mérito do inventário por uma suposta falta de qualidade das construções listadas, como eu já disse, não é o caminho certo. E se o ambiente urbano já está inicialmente descaracterizado, evitar o avanço da descaracterização é sim válido. Pra mim a perde de uma casa histórica tanto isolada entre prédios quanto em um conjunto são lamentáveis.

    • Shit happens!! Você não pode deixar tudo do jeito que você quer sem violar os direitos e a liberdade dos outros.

      Get over it!

  7. Caro Simon, boa noite. Sou leitor assiduo de seu Blog. Vejo que sua residencia foi atingida por esta listagem. A Prefeitura de Porto Alegre prorrogou o prazo de 30 dias que venceria agora em 22 de fevereiro para mais 90 dias contador a partir de 17 de fevereiro, o que dar mais tempo aos proprietrios primeiro tomarem conhecimento e aps prepararem suas impugnaes. Qualquer dvida estou a tua disposio. Grande abrao Ricardo Sessegolo. 9981.86.07

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