A modernidade ficou no passado de Porto Alegre, por Adeli Sell

Houve um tempo que Porto Alegre esteve na vanguarda da modernidade, seja na cultura, no modo de vida, no urbanismo nascente ou na arquitetura. Mas sem saber localizar ao certo quando e como, a modernidade por aqui ficou suspensa. Talvez tenha sido com a destruição do piso da Rua da Praia, com a ausência das floreiras – que dali sumiram – ou com a construção daquela escada anti-PCD feita na confluência da Ladeira, acabando com os resquícios do Largo dos Medeiros.

Em 2009, escrevi um livreto ao qual dei um título provocativo chamado “Porto Alegre, a modernidade suspensa”. Obrigo-me, agora, quatro anos depois, lançar mais um provocativo debate ao afirmar que “A modernidade ficou no passado de Porto Alegre”. Minhas reflexões e observações me levam a ter a segurança que não foi apenas um processo de suspensão, estagnação ou falha no processo civilizatório da Capital. Estamos tempo demais neste ciclo, o que me autoriza a dizer que ficamos para trás de fato.

O tema que mais castiga as pessoas, especialmente em Porto Alegre, é a falta de mobilidade. Agravam-se os problemas do transporte coletivo, que tem sua qualidade diminuída a cada dia. O não cumprimento dos horários e os deslocamentos realizados em forma de lata de sardinha são apenas algumas das reclamações.

O BRT – nosso “ligeirinho” chega com mais de 30 anos de atraso em relação a Curitiba. A nossa Orla nem poderia ser chamada assim, porque ao longo dos mais de 70 km de margem do Guaíba temos apenas alguns poucos acessos. Ao governo Fogaça e à Câmara Municipal foi apresentada uma proposta digna de uso do Estaleiro Só. Mas a mesma foi derrotada.

Ao discutirmos os Projetos da Copa, tanto no caso do Inter como do Grêmio, propostas de emendas que dariam modernidade aos dois espaços, adivinhem, não passaram. Qualquer tentativa de modernização é entendida como afronta, mas ninguém explica a razão. É um “código”: “não pode” e ponto. Há sempre uma união da esquerda com a direita, coisa que só acontece aqui na política grenalizada para o jogo do atraso. Nossa arrogância, mais conhecida como Síndrome do Mampituba, não nos deixa aprender com os outros.

Entre na Internet e conheça o que é feito em Lima, no Peru, às margens do Pacífico, com águas frias, sem o pôr do sol que temos aqui: www.munlima.gob.pe . Também não precisa viajar para Rosário, na Argentina, às margens do rio Paraná, para invejar as belezuras do lado de lá – www.rosario.gov.ar – onde é possível desbravar a cidade caminhando de ponta a ponta ou andando de bicicleta, curtindo as praças, pequenos parques, com seus pubs, quiosques e até restaurantes.

Por aqui, se falar em construir um quiosque em espaço público leva ‘pedrada’. Como imaginar, por exemplo, o Parque Marinha do Brasil sem um local de alimentação de rua? Como alguém pode aceitar o Gasômetro sem uma Banca de Jornal? Propus tirar aquelas banquinhas da orla e substituí-las por quiosques como os existentes na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. Nem pensar…

Não precisamos ir muito longe para “invejar” exemplos positivos. Pegue o catamarã e vá a Guaíba. Lá verás que eles já estão léguas à nossa frente na sua pequena orla. Agora imaginem um restaurante adentrando o Guaíba, a exemplo do que fez Lima – www.larosanautica.comOusadia escandalosamente linda.

Nossa Porto Alegre se gaba do Orçamento Participativo, mas nunca chamou o povo a dizer o que quer da Orla. Na Vila Tronco, onde estão ocorrendo as obras de ampliação da Avenida, os movimentos ditos sociais nunca foram lá para saber o que o povo acha do que fez a Associação de Moradores e a Comissão local de Habitação. Até o momento 359 pessoas trocaram sua área “ocupada” em espaço público, por um bônus de 56 mil reais para poder comprar uma casa mais decente. Elas dizem isto. Acham que modernidade é sair dos seus casebres à beira da avenida e achar uma casa com o nome de “dignidade mínima”.

No Centro de Porto Alegre, o primeiro edifício modernista feito pelo arquiteto Fernando Corona, o antigo Guaspari, foi “envelopado”. Um tremendo mau gosto. Uma jovem arquiteta apresentou como conclusão de seu curso um trabalho de repaginação, que está nas mãos do prefeito e do vice. Até agora, nada!

Próximo dali, recuperamos a Galeria Chaves, mantendo sua arquitetura exuberante, modernizando apenas a parte interna. Dali se avista outro escândalo contra a beleza e a estética da cidade, o tal Esqueleto da Praça XV: prédio inacabado que mais parece um espantalho. Quando vai o poder público ter a coragem de tomar uma decisão final?

Estão prometendo a Ladeira revitalizada pelo Projeto Monumenta. Teríamos nosso Largo dos Medeiros de volta. Podemos esperar? Ou vamos aguardar mais trinta anos como foi com o Cais Mauá? Agora, tudo indica que sai. Mas ainda tem gente torcendo para dar errado. É que não conhecem o Porto Madero, na Argentina, nem o Cais de Lisboa, em Portugal, que é muito semelhante e sucesso total e absoluto.

Uma coisa destoa de tudo o que falei: a inauguração do aeromóvel pela Trensurb. Quem sabe não seja isto um símbolo de um novo ciclo? Ciclo virtuoso da volta de modernidade em Porto Alegre. Mas, por enquanto, a modernidade ficou no passado de Porto Alegre.

Adeli Sell, ex-vereador, é consultor e escritor.



Categorias:Abandono, Aeromóvel, Arquitetura | Urbanismo, Artigos, BRT, Catamarã, onibus, ORLA, Pontal do Estaleiro, Projeto de Revitalização da Orla, Projeto de Revitalização do Cais Mauá, Projetos que não saem do papel, Retrofit, Revitalização do centro

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31 respostas

  1. Cada dia me convenço mais, que o grande diferencial que tínhamos no nosso estado em relação aos outros e que nos leva a estagnação dos dias de hoje, é a educação.
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    E quando falo em educação falo em educação pública e privada. O Rio Grande do Sul e a cidade de Porto Alegre vem verificando uma longa e penosa queda no nível de suas escolas. Não só as públicas, mas também as privadas.
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    Um dos motivos que leva a UFRGS não abrir mão do seu vestibular, e aderir ao ENEN, é que se fizer isto praticamente as vagas dos cursos mais procurados ficarão nas mãos dos alunos de fora do estado, algo que já está ocorrendo no curso de medicina da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). A direção desta universidade, num desserviço a população gaúcha, tenta esconder esta realidade mostrando que grande parte dos ingressantes na UFCSPA são gaúchos (50%) nos cursos mais procurados.
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    Agora, ninguém está aí para o assunto, talvez o último governante gaúcho que se preocupou com o ensino foi o Collares. Isto é tão verdade tanto no estado como no município.

  2. Minhas sugestões para embelezar Porto Alegre são:

    1° A construção de um roda gigante (estilo a de Londres) entre o museu Ibere Camargo e o Barra Shopping, bem no ponta do rio Guaíba.

    2° Revitalização da orla em duas etapas: a) Privada, no entorno do Beira Rio. b) Pública, do Gasometro até o Parque gigante.

    3° Construções de parques (estilo Tanguá de Curitiba) na zona Sul (Lami).

    4° Cultivo de flores, com desenhos geométricos em canteiros a serem construídos em algumas rotulas de transito em Porto Alegre (ao estilo de Amsterdâ)

    5° Plantio de 5000 mudas de árvores a serem plantadas em ruas com pouco verde.

    6° Aprovação de uma medida de lei que puna com rigor extremo quem depreda o patrimônio público. porque não adianta lançarmos ideias para os vândalos destruírem mais tarde

  3. Porto Alegre deve sua explosão nos anos 40,50 reflexo disso nos prédios antigos do nosso centro. Curitiba por exemplo explodiu nos anos 80 e tem na sua ”maioria” prédios em estados mais novos que Porto Alegre.

    Obs: O estado do Rs era o celeiro do Brasil, mas com o surgimento de novas técnicas de plantio, estados com Mato Grosso e Goias que antes não produziam, agora estão com plantio acelerado.

    No setor industrial perdemos muito pro Paraná, pelo fato desse estado estar localizado ao lado de Sp e escoar mercadorias e produtos com maior fluides.

    Outra coisa, por mais que nós gaúchos tenhamos orgulho de nossa raízes precisamos repensar muitas atitudes que praticamos, porque estamos ficando para trás e ficamos achando que ainda somos os melhores, mas na verdade estamos bem longe disso.

    Eu acho que uma das saídas seria mais união e menos radicalismo e egoismo.

  4. Só uma dica: quando fores falar diga “cabo irradiante” e não “cabo fendido”, ou vais acabar te denunciando pelos corredores da empresa. Apesar desta nomenclatura existir, não é usual chamar o leaky feeder desta forma. Fico satisfeito de estar falando com um especialista em CBTC e comunicação por rádio-frequência em ambientes confinados.

  5. Meu nome é Diego Abs, eu tenho nome e sobrenome e dou a cara a bater, ao contrário de ti, que se esconde covardemente atrás de um pseudônimo.

    Não vou discutir assuntos técnicos com alguém movido por motivações puramente políticas. O que tu estás fazendo aqui é patético.

    • Desculpe-me se te deixei nervoso, mas indiretamente me respondestes. Tu sabes, muito bem, que lá, se não acompanho a corrente eles me afogam. Por enquanto não posso me identificar plenamente porque não comprei minha boia. .

  6. Esses dias lançaram o conceito do hyperloop. Chamariam me de louco se tentassem algo assim em POA, uma inovaçao mundial. mas dai tambem chamaram o Coester de louco la no final dos anos 70, tenho certeza. E olha que o conceito de vacuo do aeromovel lembra o do hyperloop. Voce deve estar pensando por que POA algum dia tentaria isso, eu respondo com outra pergunta, por que nao? http://www.et3.com/

    • Na maioria dos sites americanos o Aeromovel é citado como referência para o projeto audacioso do Sr. Musk: “what the Hyperloop would actually look like — even in basic terms — is still up in the air, though Musk stated that he may make the details known to “anyone who can make a credible case that they can do it.” Musk also cites Aeromovel as a similar transportation network, meaning that the Hyperloop could take advantage of a similar pneumatic transportation guideway.”

      E tem gente que acha (ou quer que os outros achem) que é tudo bobagem.

      • A proposito Diego, porque a automação não funciona e é necessário um operador na estação aeroporto, um no Salgado Filho e um dentro do aeromóvel?
        Quando será comprado o cabo fendido?
        Quando será implantado o sistema de segurança?
        Quando? Quando? Quando???

        • Este é exatamente o problema do Rio Grande do Sul, lançamos um transporte movimentado por ar comprimido, ou seja, se toma a dianteira em termos de concepção de transporte. Sai nos USA algo bem diferente, porém movimentado por ar dentro de um duto, o Hyperloop, bem mais sofisticado, bem mais tecnológico entretanto ainda no papel.
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          A diferença é que aqui alguns procuram achar defeitos para martelá-lo enquanto nos USA procuram achar virtudes para começar a fazer um protótipo.
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          Viram o motivo do atraso da nossa cidade!

  7. Ele fala que area do Estaleiro So tinha uma proposta digna, mas foi derrotada.

    Eh bom lembrar que a campanha contra o Pontal foi feita principalmente pelo partido do autor, que acusa a cidade de ter a modernidade suspensa.

    TENHAM MEMORIA, PORTOALEGRENSES !

  8. A modernidade não ficou no passado de Porto Alegre, o problema é justamente porque não abandonamos a modernidade no passado onde é o lugar dela. A modernidade de extinguiu dando lugar a pós-modernidade e hoje em dia até isso já é velho.

    O que precisamos é fazer as pazes com todas as épocas e voltar ao passado em alguns casos (bondes) e saltar para o futuro em outros (educação). Isso só vai acontecer quando acabarmos com essa ideia de moderno/antigo. Há avanços em todas as épocas e o fato de algo ser novo, não significa que ele seja melhor, da mesma forma, se algo é antigo não significa que continuará funcionando para sempre.

    • Deu de pau! Muito bem Pablo. Ficam pensando em coisas do passado e não tentam olhar no que está passando pelo mundo.
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      Só olham os chineses e os países da península arábica, que estão construindo verdadeiros mausoléus High Tec.
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      Quando vejo a preocupação com a sustentabilidade nos países mais evoluídos e visito prédios aqui em Porto Alegre em que o marketing quer fazê-los como algo sustentável, me dá vontade de chorar.
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  9. O que o “antigo” Largo dos Medeiros tinha que o novo não tem? Pergunto porque desde que eu me lembro é igual.

  10. Acho que o Adeli um gerador de artigos 🙂

  11. Belo texto Adeli, concordo com tudo, só que essa tranqueira toda começou lá atrás com o próprio PT e outros esquerdopatas. Ainda lembro as barbaridades que Collares sofreu quando construiu a Edvaldo Pereira Paiva (ou como diziam privatizou a orla). Lembro recentemente a questão do Estaleiro Só, cujo projeto foi detonado após campanhas massivas contra a privatização do espaço publico (que por sinal é privado), pois bem temos agora ali uma bela fabrica de canos de cimento a vista de qualquer turista. O próprio Fortunati vem sofrendo uma sucessiva campanha de ‘NÃOS’, sempre tem um boi corneta atravessado no caminho. O catamarã para Guaíba e a revitalização do porto só foram adiante porque Yeda Crusius deu vários peitaços e chutou o balde (lembram?). Agora Tarso comemora a expansão da CMPC em Guaíba (e se fosse a governadora anterior?). Então reclamar do que? Façam justiça as pessoas e aos seus feitos anteriores!

  12. Gostaria que o senhor Adeli dissesse onde é possível comprar “uma casa mais decente” com 56 mil reais. A prefeitura manipula a população que não tem idéia do valor dos imóveis e acha que 56 mil é um dinheirão – e de fato para elas é, mas não vão encontrar imóvel nenhum com esse valor.

    • Fiz uma busca aleatória no site de uma imobiliária e a residência mais barata que encontrei foi um apartamento no bairro Protásio Alves por R$77 mil. Abaixo disso tem terrenos no Lami com valores perto de R$50mil de forma que não sobra dinheiro nenhum para construir.

      E querem que as pessoas troquem seus lares por isso?

      • Sim, seus lares de madeira com dois cômodos…

        • Esse povo e’ ruim de mais, eles preferem que essas pessoas morem na rua ou em favelas do que qualquer coisa. E’ impressionante !!!!

      • Financiar o saldo restante (igual a 99% da população) nem pensar então?

        Quem me dera eu ter 56 mil reais para poder ter dado de entrada no meu apartamento…

      • rsrs “seus lares”… Pessoal mora numas malocas brabas com gato de eletricidade, sem saneamento, sem nada, e o noiado vem falar em “lares”. 56mil e’ bem mais do que vale o local onde eles moram, agora, certamente, vao ter que achar um lugar barato pra morar. Eu, por exemplo, adoraria morar na Vila Assuncao, de frente pro Guaiba, mas nao tenho dinheiro. O que faco, entao? Vou morar em bairros mais baratos. Parece tao obvio, mas para alguns nao o e’.

  13. E’ so’ bla bla bla, e nada de concreto.

  14. Bem ne’ Sr. Adelli, seu partido esteve na prefeitura durante 16 anos!!! Vcs foram contra o metro, contra remocao de crincas de rua(ME LEMBRO DE RAUL PONT dizendo bem claro que nao queria “institucionaliza-las”, mas deixalas no frio com fome vcs souberam) Aparelharam a coisa publica com sociopatas do PT e outras esquerdas radicais com a explicita tarefa de NEGAR toda e qualquer iniciativa de melhorar a cidade, porque de acordo com vcs, “isso e’ coisa de burgues” entao nao deixavam fazer. Vcs do PT e outras esquerdas raivosas sao absolutamente culpados, toda culpa cai sobre vcs. Agora oque querem??? De um telefonema para seus aparelhos e diga para eles se acalmarem e deixarem investimentos virem a POA, diga para aprecarem as licensas para obras. Agora temos que passar por esta faze de ser do contra (porque e’ super bacana ser do contra) que vcs criaram!!! Um bando de ignorantes saudosistas do leste comunista, envelhecendo e deixando para traz um DESASTRE. Parem com o raco comunista de ser contra tudo e contra todos e deixe a iniciativa privada ir enfrente!!!!

  15. Concordo 100%. Nunca pode, “pra toda solução tem um problema”. Agora, se aí tá difícil, se aí é assim burro, vem aqui pra Floripa ver como é.. consegue ser ainda pior.

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